quarta-feira, 30 de setembro de 2009

É URGENTE FINANCIAR A SOCIEDADE CIVIL


Seria da mais elementar lucidez olhar para as instituições políticas da sociedade civil e atribuir-lhes, também, subvenções para o exercício das suas actividades políticas.


Num tempo de severa crise económica e social, os partidos políticos gastaram milhões nas recentes campanhas para alimentar vaidades, defender interesses egoístas, e mercadejar ilusões. Se o objectivo era outro…não se percebeu.

E tudo, aparentemente, dentro da legalidade que se revê na lei de financiamento dos partidos políticos e no sistema eleitoral que temos e que não são outros, senão, os que os partidos políticos vêm talhando à feição dos seus interesses, longe da racionalidade política, das melhores doutrinas e de experiências estrangeiras mais rigorosas e saudáveis.

Enquanto isso a sociedade civil, tão querida de alguns em momentos eleitorais, é deixada ao abandono logo que deixa de prover à conquista de votos.

Convêm esclarecer que o conceito de sociedade civil é antigo, vem, pelo menos, do fim do século XVII onde foi utilizado por autores diversos como HOBBES ou LOCKE e, ainda que semióticante tenha evoluído, nomeadamente com HEGEL, tem, desde os fins dos anos 70 do século passado, também em Portugal, um conteúdo manifestamente relacionado com a luta contra o totalitarismo. Refere-se a múltiplas instituições privadas de carácter associativo situadas entre o Estado e o indivíduo, incluindo sindicais, sendo que é a liberdade de actividade social, de organização e de fins que marca tal conceito.

A oposição entre Estado e sociedade civil é uma oposição artificial, mas tal não afasta uma tensão, que até é salutar, entre um e outra no sentido da definição do interesse geral ou colectivo, o que vale por dizer que, numa sociedade complexa, a sociedade civil pode – e deve – desempenhar um papel relevante em tal definição de molde a, também, impedir ideologias perversas e autoritárias quanto ao que seja o interesse geral.

É por isto, e muito mais, que a democracia não pode prescindir de ter a cumplicidade activa e genuína da sociedade civil e que, onde esta fenece, com ela submergem os ideais democráticos.
Ora o que se passa em Portugal é que a democracia desde sempre olhou de soslaio para a sociedade civil ou, mais rigorosamente, nunca os partidos políticos abdicaram de ser o princípio e o fim de toda a vida política. Aliás reservam, desde logo, para si, em exclusivo, o direito a serem, nesse campo, financiados pelo Estado.

E é assim, pois, que a lei de financiamento dos partidos políticos (Lei 19/2003 de 20 de Junho) estabelece que tal financiamento, público, tem como destinatários os partidos políticos que hajam concorrido a acto eleitoral e obtenham representação na Assembleia da República, ou, pelo menos, uma votação superior a 50.000 votos.

Os partidos políticos não são mais, porém, o cerne dos regimes democráticos e o seu declínio, por mais lento que seja, é, já, inegável. Há mais vida política, porém, para além dos partidos – mais e melhor – ética e cívica.

Assim, seria da mais elementar lucidez olhar para as instituições políticas da sociedade civil – ao menos aquelas que sejam legítima e legalmente qualificadas de utilidade pública – e atribuir-lhes, também, subvenções para o exercício das suas actividades políticas. Como isso aprofundar-se-ia a democracia em múltiplos aspectos e, desde logo, na mobilização de muitos cidadãos, hoje apáticos, para a vida pública nas suas múltiplas áreas.Lamentavelmente, em Portugal, a sociedade civil está a viver de cada vez menos cidadãos e promete morrer de vez se medidas políticas não forem tomadas com urgência. E se tal corresponde ao íntimo desejo de muitos que nada vêm para além da sua janelita paroquial, o país mereceria, até para renovar as suas ambições, de se apoiar na sociedade civil organizada e activa politicamente

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