sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

PARA SEMPRE

O Doutor Albino Aroso foi, na liquidez absurda deste tempo crísico, um verdadeiro “Príncipe do Renascimento”.

Nos fins do outono começaram a cair as folhas das árvores, mas estas ficam lá. Ficam e, chegada a primavera, novas, outras folhas acontecem-lhes.

Ainda não compreendi porque é que a Natureza, por razões até de economia, não conserva as velhas folhas e, ao contrário, se dá ao “luxo”, que um tempo de austeridade deveria rejeitar, de exibir outras. Outras?

Caíram tantas folhas este ano!

Umas caíram das árvores do meu quintal para o qual dá uma janela feita de perguntas fortes e respostas frágeis; outras dos quintais dos meus amigos e vizinhos; outras de sítios improváveis.

Não irei celebrar a primavera que há-de vir sem lembrar o Senhor Doutor Albino Aroso que viajou para o longe sem distância. Ele, foi, na liquidez absurda deste tempo crísico, um verdadeiro “Príncipe do Renascimento”.

Muitos anos atrás, ainda a liberdade era um mero possível, ouvi-o dela falar numa conferência que teve lugar na Torre da Marca, ali junto ao Palácio de Cristal. Com ele, na mesma mesa, brilhava a vivacidade de Francisco Sá Carneiro e a sabedoria de Armando de Castro, democratas de longa data. Das suas palavras irradiavam luminosas perspetivas de um outro viver mais humano e feliz. Falaram também da primavera, nessa altura, claro.

Anos passados, procurei-o um dia por razões partidárias – era uma referência incontornável da social democracia autentica – para o desafiar a assumir o cargo de presidente da mesa da Assembleia Distrital do Porto do PSD numa lista em que me apresentava como candidato à presidência da respetiva Comissão Política. Eu precisava de ir com os Grandes, para parecer grande como eles… Aceitou com imensa generosidade e lutámos (sem sucesso) pela mudança que, acreditamos, era urgente já então e, hoje, é dramaticamente ainda mais urgente.

A última vez que respeitosamente o cumprimentei foi, recentemente, na barbearia onde o Sr. Silva cultiva ainda o prazer de uma conversa com os clientes, que, mais do que isso, são amigos da casa. Altivo, esbelto nos seus noventa anos, todos o rodeámos de carinho enquanto ele deixava uma palavra de confiança na vida a pairar. Como era querido e respeitado por todos naquela casa!

Neste dia em que lhe deixei um aceno junto à barca da viagem, ouvi e li muitas palavras bonitas a seu respeito. Congratulo-me, decerto, pelo reconhecimento que lhe é unanimemente, concedido mas o que, julgo, verdadeiramente é importante é o que Albino Aroso pensou e executou para que o seu próximo tivesse mais bem estar físico, moral e espiritual. A sua vida e obra falava de dentro dos escaminhos de tantas pessoas, que seria inútil tentar verbalizar, aqui, o mar de gratidão que lhe tributamos.

O mundo hoje é outro, muito diferente daquele em que a sua ação politica, cívica e profissional estabeleceu os pilares de uma sociedade melhor. Portugal também mudou – e esse foi um dos seus combates primordiais.

Honrar Albino Aroso doravante será não deixar a luta pelos ideais que foram os seus.

Ponto é que haja pessoas da sua grandeza.



quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

OS RICOS E O NATAL

É de bom tom e politicamente correto apelar, nestes tempos festivos, à ajuda aos pobres e aos
excluídos da sociedade. Eu quero deixá-los em paz neste escrito, até porque, muitos deles, estarão com a sua consciência mais tranquila do que eu e muitos outros portugueses. Por isso convoco, antes, os ricos à praça pública, convoco-os apenas para prestarem contas à sua consciência.

Cada Homem tem em si todos os outros homens.

Geralmente os católicos e os que voltejam ao redor da sua religiosidade apenas pelo Natal evidenciam, por vezes mais em palavras do que em atos, a solidariedade, a caridade (amor) que daí decorre. No mais do tempo “salve-se quem puder” é o mote, ou seja, que cada um trate de si que isso basta a todos. Esta é, de resto, a “cultura” do nosso quotidiano ocidental, vazia de valores, liquido, consumista, hedonista, egoísta.

Um ou outro leitor, dos poucos que lerão estas singelas crónicas, têm-me assinalado que, por vezes, recorro a temas, uso expressões e tiro conclusões duras, justiceiras, porventura, expressão de alguma “dor de cotovelo” dos políticos “bem sucedidos”, e, dos “negociantes de sucesso” e de alguns outros que souberam chegar ao poder sem se perceber como e o usam também só para si. Têm todo o direito de assim pensar, mas, hoje, digo-lhes, sem qualquer hesitação, que estão muito enganados. Apenas comento atos, políticas, comportamentos, sempre, porém, em paz com os homens que os praticam e com quem me permito conviver fraternalmente se eles mo permitem. Algumas vezes, até, apenas darei forma escrita ao que os que me criticam generosamente vão dizendo nos corredores, em voz baixa, para que ninguém os venha incomodar…

Tentando situar-me fora dos cânones tradicionais de certo catolicismo, acredito com sinceridade, que o sucesso é uma bênção e a riqueza que dele advém é saudável (Max Weber, L’etique protestante et l’espirit du capitalisme). Ponto é que seja “dado” a cada um o que é seu – o que se diz Justiça. Só por aí já mudaria tanta coisa!

Dai a utopia que, em algum tempo, num qualquer “Natal”, ninguém dê nada a ninguém e que cada um dê tudo, a todos, em cada dia. Sobretudo que a ninguém seja retirado o que é seu em resultado do seu trabalho.

Na crise que atravessa a nossa sociedade, a austeridade, o medo e a indiferença vão marcar estes dias finais de Dezembro. A revolta e a indignação, em diferentes tons, também. Ora tudo tem a ver com a Política, hoje nas mãos dos homúnculos que gravitam por todo o lado e de ativistas sociais por vezes sem escrúpulos. Pior, ainda, de obscuros poderes internacionalistas, não eleitos, que comandam as finanças (e a riqueza) do mundo.

A paz social é, porém, algo de que a nossa sociedade está cada vez mais carecida. Sei bem que não é possível pregá-la a barrigas vazias… mas que é urgente, é.

Como lá chegar?

Se não me perguntarem, eu talvez saiba, mas, se alguém me pedir esclarecimentos, decerto que não saberei explicar e menos, ainda, argumentar.

É de bom tom e politicamente correto apelar, nestes tempos festivos, à ajuda aos pobres e aos excluídos da sociedade. Eu quero deixá-los em paz neste escrito, até porque, muitos deles, estarão com a sua consciência mais tranquila do que eu e muitos outros portugueses. Por isso convoco, antes, os ricos à praça pública e, entre eles, os homens e mulheres da politica politiqueira que, nela, e dela vivam, para tratar das suas negociatas à custa do dinheiro do Estado. Convoco, também, os que vivem à tripa forra por terem estado na vida política e os que se servem deles para obter sucesso financeiro ilegítimo. E convoco-os apenas para prestarem contas à sua consciência.

Temos de abrir os caminhos para recuperar a confiança perdida, numa sociedade de risco como é a nossa. Confiança pessoal (nos outros) e confiança nas instituições, no “sistema” (Luhman).

Sem uma resposta política – mas também cultural – nunca sairemos da crise.


Que o ano que se anuncia possa levar-nos a perceber tudo isto e a construir um imperativo, outro, novo, Contrato Social.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

CELEBRANDO A VIDA POR OCASIÃO DA “MORTE” DE NELSON MANDELA

Quero acreditar que o poder do amor que Mandela cultivou e levou ao apageu poderá, um dia, revolucionar os princípios da política.


Este é um aceno de ternura por alguém que sacrificou a sua liberdade para ser possível a liberdade dos outros.

Já foram, decerto, gastas todas as palavras – das mais sinceras às mais hipócritas, e outras – para homenagear Nelson Mandela. Na sua maioria não foram para além de banais esforços de auto elogio de pequenos políticos que, no transe, encontraram na ocasião um palco para se empoleirarem nos galhos da comunicação social e assim se autopromoverem à custa de um Homem a cujos calcanhares nunca chegaram nem chegarão. Afinal estas alturas são sempre propícias a uma certa boémia que consola os mais pequeninos.

O que interessa neste momento é, porém, celebrar o percurso moral, espiritual, cultural, intelectual e político de alguém que deixou uma marca presente na História.

A vida de Nelson Mandela.

A Vida, afinal.

Recordo que, quando vi na televisão a sua libertação da prisão, senti o início de um certo reencantamento do mundo. E, também que o mundo ia muito para além da Europa, sempre eurocêntrica, mas, afinal, muito minoritária, porventura, já, então, moribunda, até. Li naquele rosto, nesse momento, um outro, novo humanismo, uma grande sabedoria, a expressão de um ser humano que, tendo encontrado na vida um motivo para a perder fez desse motivo o sentido da sua existência.

Nada nasce de nada e nada se poderá tornar em nada (Espinosa). Nelson Mandela pertence a uma comunidade eterna de que todos fazemos parte, mas voou muito alto, liberto, como muito poucos das ilusões do ego. Percebeu que não era o interesse partidário, nem a perseguição cega de interesses individualistas que salvariam o seu país – e o mundo. Defendeu, por isso, a lógica da fraternidade, da entreajuda, da partilha, do perdão, do prazer de dar mais do que de receber.

Eis o que me marca ou como seu legado.

Há, pois, que celebrar a vida de Nelson Mandela, e não a morte.

Habituados a chorar – às vezes com lágrimas de crocodilo – a morte dos nossos, porventura não será porventura fácil compreender a infinita alegria que brota, quiçá entre lágrimas, dos cânticos e danças dos africanos que o adoram. Nas sociedades ocidentais tememos a morte e aprisionamos os velhos nos armazes do esquecimento. Utilitaristas que somos, só a felicidade material conta hoje no nosso quotidiano. Morrer é a infelicidade, o mal, o fim do hedonismo terrestre. Os africanos, ao contrário, vêm vida na morte, cultivam a “morte da morte”, em cada morte.

Quero acreditar que o poder do amor que Mandela cultivou e levou ao apogeu poderá, um dia, revolucionar os princípios da política.

A sacralização do humano pelo amor como expressão de uma nova espiritualidade no século XXI, anunciada por Albert Camus, é uma gramática de leitura da vida de Nelson Mandela.

Herdeiros espirituais que, muitos, dele somos, cumpre-nos mudar o nosso olhar sobre o mundo e sobre os outros homens e, sobretudo, ganhar coragem para os transformar.


Celebremos, pois, a vida de Nelson Mandela.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A RESTAURAÇÃO E O DIA PRIMEIRO DE DEZEMBRO DE 2013

Haverá no mundo outro povo que não comemore o dia da sua independência e não o considere legalmente feriado obrigatório?

Em 1640, Portugal recuperou a sua plena independência relativamente a Castela, após sessenta anos de subjugação dos Filipes.

Uma das notas da dominação filipina foi o forte agravamento de impostos, também sobre os clérigos, sob pena de pesadas sanções. Como executor perverso e intransigente dessa política destacou-se um “português”, Miguel de Vasconcelos. O povo, por todo o país e, também, no império colonial revoltava-se enquanto Madrid sugava a nossa vida.

O 1º de Dezembro sempre foi um dia feriado, sendo certo, porém, que num mundo em que os valores se foram perdendo em prol do consumismo, do hedonismo, da gratificação imediata e, enfim, do “salve-se quem puder”, a poucos já tocava o seu sentido e alcance.

O golpe final foi-lhe dado, recentemente, por uma Lei da Assembleia da República (Lei nº 23/2012 de 12 de junho) que, alterando o Código do Trabalho, deixou de ter esse dia como feriado obrigatório. Alegadamente, a promoção da competitividade da nossa economia assim o exigia… ao menos na perspetiva da “Troika”, expresso no Memorando de Entendimento, que, poderes não eleitos, nos impuseram à laia de resgate por pecados imperdoáveis que cometemos.

Haverá no mundo outro povo que não comemore o dia da sua independência e não o considere legalmente feriado obrigatório?

Não conheço.

A questão em apreço não é do foro jurídico, ou apenas desse domínio, ainda que aí revele  como o Direito está colonizado, na atualidade, pela economia e pela finança globais. Há outras e mais relevantes perspetivas de análise cuja natureza diz respeito à nossa mundividência. Sejam imperativos categóricos racionais secularizados ou, outros, de natureza religiosa, baseados em axiomas transcendentais, o certo é que as comunidades políticas têm os seus valores morais – são comunidades morais! – imersas indeclinavelmente no seu contexto histórico e cultural e, também, sociológico.

O 1º de Dezembro tem um significado centenário, num país que, por vezes, se considerou como improvável enquanto Estado independente. Disso há que ter consciência e respeito por essa consciência. Não se trata, na arqueologia dos conceitos, de um feriado qualquer. Conformou, durante muito tempo, espiritual e socialmente, o nosso modo de ser e de estar na Península Ibérica, na Europa e no Mundo. Através dele eram os cidadãos convidados a contemplar o passado e o seu destino comum nas múltiplas dimensões interiores da sua existência.

O 1º de Dezembro deveria – deverá – ser um dia de todos os portugueses. Feriado, obviamente. Nele, e por ele, se deveria reconstruir a liberdade e, sobretudo, promover e garantir a identidade, coesão e continuidade intergeracional.


A existência de Portugal como país soberano.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

RAMALHO EANES OU A MORAL NA POLÍTICA

A política é, também, a luta de memória contra o esquecimento.
No próximo dia 25 de novembro muitos portugueses vão reunir-se para o homenagear.
Não poderemos ignorar.

Num mundo angustiado e à deriva, há que reconhecer que as ciências que se ocupam do Homem têm feito progressos notáveis, mas, que, acerca de nós próprios, pouco ou nada sabemos. “A ciência do homem é a mais difícil de todas as ciências” (Alexis Carrel, O Homem, esse desconhecido, cap. I, 3).

Em Portugal, em pouco mais de uma geração, o nosso ambiente intelectual e moral mudou radicalmente, mas o homem, não. O progresso material, a riqueza e o bem estar relativos que se sucederam à Revolução de Abril, levaram iniludivelmente à desconsideração de muitos valores éticos e morais. Não mais se construíram Caravelas para descobrir mundos, nem se levantaram Templos para olhar mais além, e, ao contrário, deixamo-nos embriagar pelo perfume das novas catedrais do consumo, imediato e a crédito. Sabemos o preço de tudo, mas não sabemos o valor de nada.

O Armagedão está à porta quando os sonhos de novas primaveras são, ainda, tão recentes!

Um grupo de bravos portugueses, com memória, resolveu prestar homenagem a um homem que, um dia, se levantou contra movimentos liberticidas num tempo em que Portugal vivia, também, angustiado e à deriva. Esse Homem é o General António Ramalho Eanes.

Há que lutar contra o esquecimento e recordar essa data e aquele português. Cada dia que passa é mais tarde para o fazer, mais fundo o medo, mais ténues as forças.

Não sei – nunca soube (e fui seu mandatário para a juventude, em Coimbra, nas eleições de 1976) – se é de direita ou de esquerda. Mesmo que esta categorização ainda valha alguma coisa, tenho por certo que ele está do outro lado das coisas. Mas sei – todos sabemos – que não foi acionista do BPN, recusou ser promovido a marechal, rejeitou benesses financeiras (que os tribunais confirmaram que eram direitos seus) e nunca se “enganou” nas declarações prestadas às autoridades do país. Haverá quem possa dizer mais a propósito mas, num tempo de servidão, guarda-se de Conrado o prudente silêncio…

A política é, também, a luta de memória contra o esquecimento.

Recorrendo a velhos arquivos, encontrei no nº 2 (6 a 13 de maio de 1976) da revista OPÇÃO um editorial de Artur Portela Filho (p. 15) que já então enunciava o que se confirmou, depois, e que aqui queria sublinhar: “Porque Eanes não é um presidente cómodo, fácil e emotivo “ (…) ”Eanes é outra incursão da moral na política” (…) “É certo que Eanes tem, da democracia, a teima, a firmeza, o rigor”.

Como estas palavras soam no limiar da nossa inquietação atual!

No próximo dia 25 de novembro muitos portugueses vão reunir-se para o homenagear – “Como reconhecimento moral e cívico dos altos serviços que prestou, e continua a prestar à Pátria de todos nós, através da postura de grande lucidez que continua a revelar perante os graves problemas com que o nosso país se confronta, e como apelo às novas gerações que são o nosso futuro” (do texto que anuncia o evento).

Não poderemos ignorar.

Lá estaremos!


[Quem se quiser inscrever na Comissão Cívica Pública deve fazê-lo para o site: www.testemunhopublico.pt]

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

CARTA ABERTA AOS DOENTES POBRES DO MEU PAÍS POBRE

Ninguém tem culpa por ter nascido em Portugal, mas todos temos a obrigação moral e cívica de nos indignarmos quando, em proveito próprio, alguns sugam a vida da nossa vida – da vossa vida.

Vejo, oiço e leio que estais a sofrer os efeitos da iniquidade de uma política de austeridade que já vai muito além do que seria humana e eticamente suportável. E que as vossas vidas já estão, por isso, em risco.

Sei bem, também, que os desmandos dos usurários negociantes de serviços ligados à saúde causaram ( causam ainda) danos gravíssimos ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), tanto quanto o tem extorquido escandalosamente empresas fornecedoras de produtos e bens necessários à prestação de cuidados de saúde. Em grande parte estais a sofrer as consequências do egoísmo e, pior, de práticas criminosas de corporações e de empresas administradas por verdadeiros ladrões do Estado, protegidos por cumplicidades inconfessáveis, por vezes dentro do próprio sistema de saúde.

Ninguém tem culpa por ter nascido em Portugal, mas todos temos a obrigação moral e cívica de nos indignarmos quando, em proveito próprio, alguns sugam a vida da nossa vida – da vossa vida. Por isso vos escrevo, solidário, esta carta, assumindo, com todas as consequências, que muito do que estais a sofrer, é fruto de crimes de poderosos interesses que mandam de facto neste país. Mas é também fruto da inépcia de alguns que nos tem governado e que só sabem contar até dez – e cortar, cortar a eito nos nossos mais elementares direitos de cidadania.

Vós, pobres doentes deste triste país, que andais à míngua de cuidados de saúde, medicamentos, transporte hospitalar… sabeis, por acaso, que qualquer cidadão da U. E. que se apresente num hospital português recebe tudo o que precisa e não paga (quase) nada?! Sabeis que países vários, como a Inglaterra, mandam para se tratar em Portugal os súbditos de sua Majestade, disfarçados de turistas, e que somos nós, portugueses, que ficamos com os respetivos custos?

Falta dizer-vos mais.

É que várias companhias de seguros – dessas que mandam visitar-nos garotas de mini-saia para firmar contratos de seguros e, depois, “coronéis” odiosos para renegar as eventuais consequências dos sinistros – estão a defraudar a Lei, a mentir aos seus clientes e a prejudicar criminosamente o nosso país.

Eu explico. Ao contratar uma viagem é geralmente imposto “suavemente” aos turistas que procuram Portugal um seguro, designadamente para eventualidades de acidente ou doença – seguro que paga. Se por infelicidade acontece um sinistro, o que se passa, geralmente, é que essas seguradoras assobiam para o lado (quando não expressamente recusam cumprir as suas obrigações) e mandam os segurados apresentar, nos hospitais portugueses o Cartão Europeu de Saúde que lhes permite imputar as respetivas despesas ao SNS. Sol na eira e chuva no naval: recebem o preço da apólice e afastam as obrigações que, nela, assumiram. Assim vai o mundo dos negócios!

Estão a ser tomadas, em Espanha, importantes medidas para obviar ao despudor desta gentalha. Por cá ninguém se indigna, porém, e, pior, escrevem-se pareceres masoquistas a defender esta burla.

Pobres doentes do meu país: o vosso destino não tem de passar pelo medo e pela perda da vida à míngua de recursos. Por isso vos anuncio que a H. L. P. Health & Leisure Portugal -  Associação para a Promoção do Turismo de Saúde, instituição sem fins lucrativos, vai apresentar queixa à Comissão Europeia contra esses espertos e denunciar a situação ao Tribunal de Contas. E iremos até ao Tribunal de Justiça da União Europeia se o Governo português não alterar rapidamente os procedimentos tradicionais, característicos de um país subalterno.


É o nosso compromisso.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

TURISMO DE SAÚDE E BEM ESTAR – UMA APOSTA DE FUTURO

Portugal tem inúmeras vantagens competitivas nesta área que não têm sido, porém,
relevadas e parece, aliás, que não há grande interesse em levantar âncora
neste novo mundo de competição global.

No meio de uma crise que abala, de alto a baixo, a sociedade portuguesa, estão a nascer à margem do Estado projetos e iniciativas de profunda relevância para o futuro do país. Porque têm o seu epicentro fora do âmbito do polvo que continua a ser Lisboa (para quem o resto do país é mera paisagem) a comunicação social que desgraçadamente temos - cada vez mais a voz do dono – não lhes dá qualquer atenção. Há, porém, que lhes dar luz e, também, que realçar quanto, várias entidades associativas bilaterais (câmaras de comércio e indústria), se mostram interessadas nessa perspetiva de um país melhor e dispostas a colaborar no seu âmbito de ação.

Foi o que aconteceu na passada segunda-feira, 14 de outubro, através da realização de um importante seminário organizado pela Câmara de Comércio e Indústria Luso-Francesa sobre Turismo de Saúde e Bem Estar e que contou com uma plateia numerosa, também de investidores franceses, interessadíssima no tema. Refira-se, de resto, que essa Câmara de Comércio, editou, ainda, mais um número da sua revista, ASPECTOS, sobre o tema do Turismo de Saúde e Bem Estar, coordenada com superior competência pela Sr.ª Drª Ana Meneses e com contributos de altíssimo valor. Sublinho, também, que, no dia 21 de outubro, se realizará uma importante “Encontro de Gestores”, no Auditório do Centro Hospitalar da Cova da Beira para debater o Tema “Saúde em Portugal: estratégias para um desenvolvimento sustentável”. Imperdível.

Mas o que é isso de Turismo de Saúde e Bem Estar?

O Turismo de Saúde e Bem Estar, numa primeira abordagem, simples, tem a ver com o tratamento de qualquer doença no local mais propício à sua cura, seja em que país for e, tendo em conta que a saúde, atualmente, já não assenta no paradigma da doença mas, ao contrário, tem avançado para novas dimensões ligadas ao bem estar e à transformação do corpo. Segundo a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS) “a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças”. (cfr. www.who.int)

A saúde vem sendo perspetivada, com efeito, no sentido de bem estar, segundo um paradigma salutogénico e não patogénico. E neste quadro, as pessoas são convocadas para terem uma participação ativa nesse processo, que já foi referido como, uma “nova religião.”
A saúde é hoje, cada vez mais, uma questão de estilo de vida com uma inegável dimensão simbólica e cultural. O século XXI, com efeito, vem assistindo, face a novos paradigmas societais e ideológicos, ao desenvolvimento do Turismo de Saúde e Bem Estar – o que já se designou por “Nova Saúde” – em que, ao alheamento do Estado Providência, sucede a responsabilização individual.

Portugal tem inúmeras vantagens competitivas nesta área que não têm sido, porém, relevadas e parece, aliás, que não há grande interesse em levantar âncora neste novo mundo de competição global. Na verdade, agrilhoado num sistema normativo e burocrático do tempo da leviandade do caminho para o socialismo (comunismo) inscrito na Constituição de 1976, a vontade política de mudar para o futuro anda aos solavancos entre ministérios numa confusão e com uma inércia arrepiantes.

Quem manda não sabe, e quem sabe não manda… E, uns e outros, não deixam a sociedade civil ousar esse desafio. Pior que tudo, parece, ainda, que alguns poderes fácticos, não eleitos, (leia-se lobbies) se antepõem, com a passividade da soberania nacional (… a pouca que ainda existirá) para entravar os legítimos objetivos empresariais nacionais em beneficio exclusivo dos seus interesses sem rosto.

A “Troika” sabe bem o que quer e não quer mais do que aqueles a que está enfeudada também querem. O seu empenho é viver à custa dos pobres países resgatados, empobrecendo-os, explorando-os e aprisionando-os às suas regras imorais.


Até quando?

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

O CUSTO DA EDUCAÇÃO

A Educação também se vende. E é melhor ir por aí do que fechar escolas e despedir professores.


Os mais qualificados, sem emprego, partem após os estudos.

O país fica fragilizado.

Os que ficaram, não prosseguem a sua formação por falta de meios.

O país fica hipotecado.

Vai-se, assim, o presente e desmorona-se a esperança num futuro melhor. E neste jogo de soma nula outros ganham o que nós perdemos.

Interrogo-me, neste contexto, sobre a estratégia do país quanto à Educação – na eventualidade de haver alguma – e como ela estará a ser desenvolvida. A minha convicção é que tudo na Política, hoje, se resume a questões de tabuada. A austeridade, que tem razão de ser, sublinho, quando, porém, é cega e fruto de certas ideologias leva a disparates inqualificáveis. O que se agrava quando a mediocridade, o egoísmo e os interesses pessoais se agarram à mesa do poder.

Não há professores nem escola a mais. Há, sim, estudantes a menos. É que nada se dinamiza para combater a queda demográfica que nos vai minando, ou a desertificação do interior do país que nos está a tolher o futuro. Combater estes flagelos apocalípticos exigiria politicas ativas que nem será preciso inventar. Bastaria sensibilidade democrática e visão de futuro, que não há. Um dia, que não virá longe, se tudo continuar na mão das corporações que nos (des)governam, então, por falta de crianças e de território viável, só restará apagar a luz e fechar a porta ao Estado falhado que seremos (ou, já somos?).

Um outro aspeto que continua a ser descuidado tem a ver com o desprezo pelo valor da língua portuguesa no mundo global. Hoje mesmo presidi a um almoço de empresários franceses e portugueses. O discurso oficial, a cargo de um representante do governo português (?), foi feito em inglês (globish, mais precisamente). Sinal dos tempos, contestar-me-ão, e destino inelutável. Não aceito. Como rejeito liminarmente que, em cursos de formação avançada, designadamente universitários, as aulas sejam dadas em inglês. É provincianismos a mais e prospetiva a menos. Quem frequenta tais cursos – também, os estudantes estrangeiros – teriam, a médio prazo, muito a ganhar, tanto quanto o nosso país, no uso corrente da nossa língua. Mesmo quando as aulas fossem lecionadas em francês, inglês, alemão ou italiano, o que seria normal, a língua do curso deveria ser a portuguesa. Note-se que para frequentar tais cursos há que ter habilitações suficientes e, uma das exigências para escolher os candidatos deveria ser compreender, pelo menos, todas essas línguas, além da portuguesa. Enquanto imperar a tabuada (o negociozito) e o facilitismo só trabalharemos, porém, para assar as castanhas que outros irão comer.

Uma nota final. Em vários países, como é o caso do Reino Unido, a formação, exigente e de grande qualidade, não é alheia aos ritos e ao simbolismo que a cultura enraizou em muitas universidades. E assim é que o fim de um curso é, também, num momento de festa, alegria e, até, folclore (quem tem medo da palavra?). Aí impera uma outra perspetiva legítima do ensino que é a economia. Alguém tem ideia de quanto beneficiam economicamente as escolas onde está viva a cerimónia de imposição de insígnias no fim de um curso obtido num país estrangeiro?

A Educação também se vende. E é melhor ir por aí do que fechar escolas e despedir professores.

Deixemos de ser pedintes e de viver de amigos.

Sejamos ousados, inovadores, diferentes.

Claro que é mais fácil viver à custa do Estado (vejam, olhem já as movimentações dos ratos, após as alterações do poder autárquico, à cata de ração!) mas, por aí, só mudam as moscas…


quinta-feira, 26 de setembro de 2013

OS PARTIDOS POLÍTICOS NÃO PODEM SER UM LUXO DA DEMOCRACIA

O dinheiro público adstrito à atividade partidária deveria contemplar, apenas, o âmbito em que esta contribuísse para a sustentabilidade e a promoção da democracia política, económica, social e cultural.

Os cidadãos pagam cara a existência dos partidos políticos, mas estes gastam mal o que lhes é pago. Eles acham que não e querem sempre mais, mas o comum dos cidadãos, entre os quais me incluo, pensa exatamente o contrário.

Não há, é certo, democracia possível sem partidos políticos – que fique claro – mas estes não podem ser e estar na vida pública à margem de regras jurídicas exemplares e sujeitos a rigorosa accountability. Foi, de resto, também, o facto de terem medrado à rédea solta que conduziu ao desprestigio profundo em que se encontram e à crise da própria ideia de democracia representativa.

Não se deverá escamotear, também, que há democracia política muito para além dos partidos políticos. O fenómeno das candidaturas independentes às próximas eleições locais – ainda que escamoteando, por vezes, a verdade da respetiva conexão partidária – aponta para a necessidade de reflexão sobre a intervenção da sociedade civil na vida pública para além do que cabe aos partidos.

A situação portuguesa evidencia que há que mudar muitas regras no relacionamento dos partidos políticos com a sociedade e, sobretudo, na sua própria organização interna.

O regime de financiamento dos partidos políticos, seja público ou privado, não tem em conta, o modo como o dinheiro é gasto e, muito menos, um critério justo e realista na sua distribuição (a quem e, sobretudo, quanto). Na situação crítica que atravessamos neste novo milénio é, então, gritantemente inaceitável, a meu ver, o dispêndio de tanto dinheiro público para tão maus fins como são alguns daqueles que, geralmente, os partidos políticos prosseguem. Sublinho, de novo, que não pretendo, em caso algum, diabolizar os partidos políticos mas, apenas, convocar à reflexão sobre esta dificil matéria.  Trata-se de uma questão que é também de austeridade –não como sanção, ou castigo, mas de austeridade no sentido de rigor no controlo das despesas e gastos, de metanóia.

Adivinha-se o crescimento de um tempo pós institucional em que o povo voltará a fazer a roda onde os partidos hão-de dançar. Ponto é que, a tempo e horas, e não já em estado de emergência, se encontrem as melhores soluções para o futuro.

O dinheiro público adstrito à atividade partidária deveria contemplar, apenas, o âmbito em que esta contribuísse para a sustentabilidade e a promoção da democracia política, económica, social e cultural dentro de um rigoroso enquadramento legal. Deveria, nomeadamente, financiar - generosamente - o trabalho de gabinetes de estudo e a formação política – mas não, decerto, as aterradoras “Universidades de Verão” – que pouco mais são do que centros de formação profissional para um emprego dos “jotas” no Estado.

A militância partidária não pode, por si, ser a antecâmara de uma profissão “política” nem pode servir para pagar bem, em regime de outsourcing, aos gabinetes de advocacia e de consultoria, dos donos dos partidos e dos muitos intermediários que pululam no palco da promiscuidade entre o poder político e o poder financeiro, um  pé ali e outro aqui, quantas  vezes “jotas” que assentam praça como generais e fazem da vida – e ganham-na – num contínuo processo de criação de dificuldades para, depois, vender facilidades através dos canais partidários.

Os partidos políticos são o sangue da democracia representativa e outra não há no mundo global, complexo e de risco em que vivemos.

Há que ajudá-los a regenerar-se, por isso ou, com o seu fim, irá para as calendas a própria democracia. Mas eles não podem continuar fechados à sociedade. Têm que se abrir e ser transparentes, e a sociedade, encontrando motivos para rever-se neles,  também se lhes deve abrir. E não só em épocas eleitorais.

Há um cinismo trágico na democracia representativa em que temos vivido que nada augura de bom. Não será suficiente, cremos, admitir a participação de independentes, fora das organizações partidárias, nas eleições. Se os partidos políticos não arrepiarem caminho, serão as vitimas primeiras da sua própria organização e métodos. Que se cuidem e depressa.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

AS SOBRAS DE UM JANTAR E A SOLIDARIEDADE QUE FALTA

A cultura da liberdade foi uma conquista difícil e dolorosa. 
Destruí-la é muito mais fácil que foi construi-la.

Ao terminar um agradável jantar numa esplanada repleta de comensais, dei-me conta de que restavam, ainda, nas travessas, alimentos suficientes para uma outra refeição. Acontece que, ao levantar a mesa, o empregado do restaurante encavalitou pratos com restos, travessas com excessos e tudo o mais que FICARA do prazer da refeição. Amalgamou tudo, o supérfluo, o bom, e o inútil. Observei-lhe, então, que me parecia indecoroso esse tratamento uniforme e que seria conveniente aproveitar o que sobrava, imaculado, dando-lhe porventura uma utilidade solidária. Não …, não poderia ser, era proibido, replicou.

Uma vez mais se evidenciou, então, como neste tempo apocalíptico sabemos o preço de tudo, mas não conhecemos o valor de nada (cfr. Frank Ackerman e Lisa Heinzerling, Priceless, On Knowing The Price Of Everything And The Value of Nothing, The New Press, 2004).

A cultura da liberdade e do empreendedorismo, que vem já dos anos 1960 e trouxe às sociedades democráticas, é certo, grandes benfeitorias, levou, também, ao caminho da desregulamentação, da liberalização e da privatização, dinâmicas estas exponenciadas pelo ideário neo-liberal. O individualismo que se foi impondo paulatina mas radicalmente nesse contexto, também como estilo de vida – a cultura do “primeiro, eu!” – levou à situação crítica atual.

Não é só, porém, o individualismo reinante que ignora a solidariedade e o dever de partilha inscritos no destino humano. Um certo movimento higienista, com fundamentação séria e louvável – mente são em corpo são – foi entretanto desviado e engolido pelo crocodilo da economia (Cfr. Fiódor Dostoiévski, O Crocodilo, Estrofes e Versos, 2011), com o que interesses vários, difusos, puramente mercantis, vieram impor um fanatismo higienista sem limites e atingiram a vida privada de todos nós. Do tabaco ao álcool, esse fanatismo vai-se incrustando na sociedade face à passividade com que é aceite como bom.

Como em qualquer outro fanatismo – religioso, racista, ecológico ou ideológico – os fins justificam os meios e aí estão, consequentemente, proibições várias, penas fortes e fiscalidade convenientes convocados e impostos pelo novos “ayatollahs”. Sendo, alegadamente, por uma boa causa, tudo se justifica, designadamente o que deve ser, ou não, o comportamento de cada um. (…) “Ele desceu da montanha e, falando ao povo, disse: Anuncio-vos o Super-Homem, aquele que há-de dominar a terra” (Nietzsche, Assim falou Zaratustra).

A cultura da liberdade, património universal de todo o homem, foi uma conquista difícil e dolorosa, muitas vezes. Destruí-la é muito mais fácil que foi construi-la. Se o assistencialismo, que se vem instalando neste tempo em que o Estado social parece próximo do último suspiro, não é nada de bom, quando traz no bojo o austeritarismo de certos interesses, torna-se muito pior. Não é que a cultura do individualismo e da individualização seja melhor. A questão é que nesta conflitualidade se mata o Homem social e a solidariedade genuína.

As burocracias do Estado e os seus caprichos e interesses, próprios e assumidos de terceiros, não podem levar, por qualquer meio, a fins que se justifiquem socialmente.


Quem ficaria prejudicado, afinal, se aquelas sobras a que aludi no início desta crónica tivessem sido devidamente encaminhadas para alguém com fome? Ou não há fome em Portugal neste início tresloucado de um novo milénio?

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A REVISÃO CONSTITUCIONAL INCONSTITUCIONAL

A reforma do Estado não pode jamais ser reduzida a uma mera questão financeira ou de preço de qualquer serviço.

Não será preciso ser especialista em Direito Constitucional para se perceber que o poder político instalado está a tentar levar a cabo uma revisão da Constituição da República Portuguesa através de meios inconstitucionais. As sucessivas declarações de inconstitucionalidade pronunciadas pelo Tribunal Constitucional evidenciam-no à saciedade.

Uma Constituição nunca é perfeita, nem será definitiva. Cada geração tem, de resto, legitimidade para, através dela, traçar o destino que pretende que seja o seu. Há, porém, direitos e deveres constitucionalmente consagrados que decorrem de princípios que não poderão ser postos em causa sem hipotecar a dimensão humana de cada um de nós e as maiores conquistas civilizacionais do nosso tempo.

Defendo a necessidade e a urgência de revisão da nossa Constituição em múltiplos aspetos à cabeça dos quais coloco o tema das funções do Estado e o da sua consequente reorganização, mas não gostaria que essa revisão acontecesse no braseiro de uma qualquer revolução. Creio, porém, que é para aí que estamos a caminhar.

O artigo 284º da nossa Constituição determina a competência e o tempo da sua revisão e o artigo 288º os limites materiais do seu possível âmbito. O poder dos não eleitos – e de outros, eleitos mas ao serviço daqueles – parece, porém, não obedecer a quaisquer limites nem fronteiras, com o que a tese da revisão revolucionária ganha, cada vez mais, possibilidade de acontecer. Também pelo lado dos excluídos da dignidade de viver (e de morrer, até) a “revisão” revolucionária pode deflagrar (quem já não tem nada a perder…) a todo o tempo. Se algum ensinamento da história tem aqui acutilância, parece que poucas dúvidas deverão entorpecer o necessário, mas fora de moda, patriotismo.

Quando quem manda e comanda sabe o preço de tudo, mas não conhece o valor de nada, todos os caminhos servem para chegar onde lhes interessa. A reforma do Estado – urgente como já referi – não pode jamais ser reduzida a uma mera questão financeira ou de preço de qualquer serviço, seja no Ensino, na Saúde ou em qualquer outra área. Mas a tal tem sido limitada por uns quantos políticos que mais não sabem que subtrair (para os outros), somar (pare eles), dividir (para reinar) e multiplicar (para os amigos). Reformar o Estado implica muito saber (ideológico, doutrinal, jurídico, sociológico…) e muito trabalho, sobretudo muito trabalho.

Não vejo nas instâncias do poder atual quem o saiba ou o queira fazer. Aliás o Dr. Paulo Portas, porventura o menos mau num governo mais que frágil, já deveria ter cumprido, há muito, a sua promessa de apresentar o pertinente projeto sobretudo agora que é quem manda no Governo. Não o fez e, creio, nunca o fará. E ele sabe bem porquê, tal como Passos Coelho e a sua idêntica promessa.


Na impossibilidade de uma revisão constitucional segundo os princípios democráticos previstos na própria Constituição, pretendem alguns fazer, hoje, avançar uma revisão de fato (oculta) das normas constitucionais de que não gostam, ou que não convém ao seu projeto neoliberal travestido de dívida pública, défice, etc. A questão é, então, a de perceber e explicar que se os direitos, em tempos de necessidade, têm de ser comprimidos ou suspensos o pertinente critério tem de ser igual para todos (princípio da igualdade). E há que ponderar, também, se não haverá direitos – como os Direitos humanos – que, de modo algum, poderão ser violados, custe o que custar, em tempo algum. É evidente que a resposta só poderá ser afirmativa. Ponto é que os interesses e a ganância de alguns o não considere e, antes, continue a sugar sem escrúpulos, a vida de muitos.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

O MÊS DE AGOSTO

“a vida é a passagem do espírito pela matéria”

Por razões tão difusas que nem as consigo verbalizar, tenho a crença de que em agosto acontecem, todos os anos, calamidades e tragédias. E lembro, para me justificar, desde logo, o incêndio no Chiado, (e tantos outros pelo país fora) mas, também, inúmeros outros factos, como acidentes graves e mortes, anunciadas ou não. Possivelmente é o ritmo de vida que, mais lento nesse mês, me permite olhar detidamente, então, para o “mundo da vida”, pois durante o ano é a política de mercearia que me obriga a consumir sempre que oiço os media a vender notícias que me ocupam e preocupam. É, na verdade, uma arte a do mensageiro (media) que nos leva a consumir tanta inútil obscenidade! E, a propósito, aqui deixo uma sugestão a respeito dos fogos: que as televisões acordem em se interditar de dar aos espetadores a mínima imagem de fogos florestais. Já todos sabemos, há muito, que o país está a arder e, com chamas nas televisões a toda a hora, haverá muitos incendiários a sentir-se espevitados para mais uma ignição.

Adiante.

Sensibilizou-me, nos dias mais recentes, este ano, o óbito de Jacques Vergès. Também o de Urbano Tavares Rodrigues e o de António Borges. Sem angústias ou medos – “a vida é a passagem do espírito pela matéria” (Fernando Pessoa) sempre a caminho do retorno à Natureza – olhei apenas para o que representaram para mim estes homens que, mais ou menos, conheci em vida.

O que, no transe, é de relevar, não passa por lembra-los numa elogiosa biografia ou hagiografia, mas focar-me nos valores pelos quais os referenciei um dia, os acompanhei depois, e não os esquecerei jamais. Não que me identifique passivamente com os seus valores, mas porque, sobretudo, os deles confrontaram-se com os meus, porventura na busca intemporal da verdade.

Jacques Vergès, que faleceu em Paris no passado dia 15 de agosto, foi um advogado que ficou ligado a causas apocalípticas, nomeadamente ao defender alguns ditos grandes criminosos, tais como Klaus Barbie, conhecido criminoso nazi ou Pol Pot, líder dos Khmers Vermelhos no Cambodja. Advogado, como ele, confesso que sempre me inquietou na minha vida profissional ter de defender situações consideradas, à partida, escabrosas. De resto tive, muitas vezes de responder à fatídica pergunta: “E tu defendeste esse criminoso?” Ancorei-me sempre numa frase do António José Saraiva, Filhos de Nepturno: “Cada homem é um deus aprisionado num corpo”. E, assim, posso afirmar que defendi muitas vezes o Homem que vestia de criminoso. Como homem (como eu) sujeito a errar e com direito à sua verdade e ao eventual arrependimento. Sei, também, que outros que não defendi, grandes criminosos, andam por aí de Ferrari, frequentam os mais caros restaurantes e continuam no palco político e social. Mas deles não se fala…

Vergés foi ousado mas, sobretudo, terá percebido que “há mais coisas no céu e na terra” do que alguns pensam.

Urbano Tavares Rodrigues, um “malvado” comunista, deu-me longas horas de prazer através da leitura das suas obras. Nelas encontrei a fraternidade simples que só os escolhidos sabem cultivar. Escreveu sobre todos os homens e sobre o Homem todo. De ontem, de hoje, de amanhã.

António Borges, falecido em Lisboa no dia 25 de agosto representa um caso diferente – aparentemente diferente – nos escaninhos da transitoriedade humana. Desde que, um dia, no ano de 2005, me confrontei com ele num debate, num hotel do Porto, em tempos de uma ilusão politico-partidária que o parecia motivar, fiquei alerta para as consequências de um certo liberalismo desgarrado da realidade portuguesa. Muito longe do seu ideário, julgo que o que mais me levou a admirá-lo foi o seu permanente combate em prol das suas ideias. Ele julgava-as justas e por elas lutou sempre, até ao fim. Só por isso me curvo perante a sua memória.


A vida continua. Os exemplos não se esquecem.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

CONSTRUIR UM NOVO PORTUGAL, TAMBÉM PELA “EXPORTAÇÃO” DA EDUCAÇÃO

O financiamento do sistema de educação em Portugal atravessa dificuldades dramáticas, mas é inegável nele se integram profissionais da excecional qualidade intelectual e não faltam instituições de ensino competitivas ao nível do que de melhor há no mundo.


Aproveitei o solstício de verão para olhar de outro sítio para a crise que nos atormenta – de um ponto de vista menos pessimista e interpelando, sobretudo, as oportunidades de construirmos um novo Portugal. Na última crónica referi-me, por isso, ao Turismo de Saúde e Bem Estar. Agora deixo umas breves linhas sobre educação.

Assomou-me à memória, nessa reflexão, recorrentemente, Agostinho da Silva e a sua fé numa missão especial de Portugal no mundo: a de construir um Quinto Império cultural (já oiço vozes a clamar: loucura! - mas deixem-me ir até ao fim). Recordo, em particular, uma frase “A Europa esgotou-se no Poder e temos, agora, de partir para outra fórmula que é cada homem ser aquilo que é” (in Agostinho da Silva, Dispersos, p. 128). Loucuras vulgares, decerto…

Face a todos os problemas que surgem ao evocar esse termo, polisémico e de largo espectro, é na perspectiva de sistema que vão ancorar estas breves linhas. E com os olhos, tanto quanto possível, virados para o amanhã. Convoco, para tanto, alguns conceitos e ideiais da chamada “economia de educação”, designadamente os aspectos “micro económicos” do sistema educativo.

O financiamento do sistema de educação em Portugal atravessa dificuldades dramáticas, mas é inegável nele se integram profissionais da excecional qualidade intelectual e não faltam instituições de ensino competitivas ao nível do que de melhor há no mundo.

Porquê, então, a presente crise?

Creio que se tem, olhado excessivamente para o dia-a-dia ou, então, para as grandes filosofias, deixando, porém, de lado coisas simples em busca de respostas complexas que nada têm resolvido.

Anda na boca de muitos a ideia de exportação do Ensino Superior – atrair alunos estrangeiros para as instituições de ensino supeior portuguesas. O objetivo é meritório e, mais do que isso, estratégico também para a economia nacional. Outros países já descobriram essa mina há muito tempo. Acontece, porém, que, deixando nós tudo ao “desenrascanso” e ao voluntarismo de alguns, o mundo ignora Portugal também como destino para estudar. E, os poucos que não ignoram chegam cá e têm aulas em “globish” – o inglês da praia e das discotecas.

Ora para isso iam para os EUA ou para o Reino Unido!

Defendo, pois, que se valorize a língua portuguesa nesse ensino, deixando de lado o provincianismo tradicional. Aulas em português, por professores portugueses e, eventualmente, em outras línguas (repito, outras) por professores eméritos de outras nacionalidades, se for oportuno.

Não ignorem, o potencial económico de língua portuguesa – atual e futuro. Pensem e informem-se, senhores do poder. Leiam, por exemplo, esse livrinho fundamental de Luís Reto (“Potencial Económico da Língua Portuguesa”, Texto, 2012), além dos já escritos de Agostinho da Silva!

E para concluir, que o espaço é curto, haverá alguém disponível para apoiar a institucionalização de um projeto de mobilidade de estudantes de todos os países de língua portuguesa, algo tipo “ERASMUS”?

A Fundação Afro-Lusitana (que a irresponsabilidade que nos governa quer extinguir sem contraditório) vai tentar fazê-lo. E, também, organizar uma Universidade de Verão para esses estudantes.


Voltarei a estes temas um dia.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

DAR UM FUTURO AO NOSSO PASSADO

Somos detentores de saber, instituições e infraestuturas que poucos países mais possuem, mas temos vindo a levar ao descalabro essas situações exemplares e os possíveis que eles contém.

Em tempos de crise, de forte tempestade, uns erguem altos muros, mas outros constroem moinhos de vento.

Não vale mais a pena perder tempo com as garotices dos “jotas” que, sem preparação política nem a mínima qualificação, sequestraram o poder neste país e não o querem largar. Continuarão no governo e à mesa do orçamento mas num país que já não é soberano, nem seu. No fundo, tomando a metáfora de Pedro Adão e Silva, movendo-se como o galispo a quem, cortada a cabeça para ir para o tacho, ainda assim corre desalmadamente, sem tino, até ao destino final, inexorável, por mais altos que sejam os muros que tenham construído.

Há alguns portugueses, cá dentro e lá fora, que, ao contrário, lutam por um futuro digno, decente, próspero e racional. Há que olhar mais do que nunca, agora, para os seus exemplos e para aquilo em que acreditam. Para os moinhos em que os ventos da crise poderão, afinal, produzir um outro mundo, melhor.

Nesta e nas próximas crónicas, vou referir-me a duas áreas em que não poderemos ignorar as oportunidades de vencer. Uma, a que hoje abordarei, é o Turismo – particularmente o turismo de saúde e de bem estar. A seguir abordarei a Educação. Num e noutro âmbito somos detentores de saber, instituições e infraestuturas que poucos países mais possuem. Acontece, porém, que com exacerbado populismo e falta de “mundo” nas nossas cabeças, temos vindo a levar ao descalabro essas situações exemplares e os possíveis que eles contêm.

Temos um Serviço Nacional de Saúde que já foi considerado um dos melhores do mundo, bem como hospitais privados de grande qualidade, o que, infelizmente, não tem paralelo na generalidade dos países, nomeadamente nos de língua portuguesa, mas não só. E esta situação não se reverterá senão daqui a muitos anos. Além disso, num tempo posmoderno, assiste-se, sobretudo no Ocidente, ao renascimento do turismo de saúde e de bem estar.

Porque não partilhamos o nosso ser, o nosso ter, o nosso saber com os que possam estar interessados?

Precisamos de espírito de conquista e de planos de batalha, - de uma estratégia – que, em vez de incentivar os melhores médicos, enfermeiros, administradores hospitalares e outros profissionais de saúde a partir para outras paragens à mingua de condições dignas de vida neste país, aqui encontrem a sua realização pessoal contribuindo também para o bem estar de todos e o desenvolvimento de Portugal.

A saúde e o corpo são bens que o futuro humano cada vez mais consagrará. Se temos um terreno fértil, porque razão não o cultivamos dando curso a uma verdadeira revolução paradigmática na saúde?

Conheço várias tentativas e, até, casos reais em que tal ambição está presente, mas estou consciente, sobretudo, do espírito fechado, mesquinho de uma sociedade empresarial velha, enquistada em padrões tradicionais e, sobretudo individualista. A revolução urgente, não se compadece com estes novos “velhos do Restelo”.

Há, por um lado, que partilhar conhecimentos, instrumentos e objectivos.

Impõe-se, por outro, que o poder político não estorve e, pelo contrário, lidere politicamente – mas não se meta no negócio! – a divulgação de Portugal como destino para o turismo de saúde e bem estar.

Se assim for, não tenho dúvidas que o futuro já vai começar.


quarta-feira, 3 de julho de 2013

ADIANTE, QUE SE FAZ TARDE

Querem ir sem nós? Pois bem, nós seguiremos sem eles.
 Enquanto os donos dos partidos políticos se digladiam, uma vez mais, decrépitos, para saber quem lava mais branco, a nossa vida contínua neste vale de lágrimas a que nos levou, diz-se, a crise de 2008. Há, porém, que parar e pensar: não seremos, muitos de nós, cúmplices da crise? A vitimização não será um “desporto” nacional? Poderemos, como nação, viver algum dia sem andar com a mão estendida, mendicante, na pedincha de ajuda ou, desonesta, a gozar à custa do trabalho dos outros (colónias, União Europeia…)?

Um indício de resposta foi-me trazida nestes dias mais fortemente enquanto esteve no Porto, a convite do Forum Portucalense, o Sr. ILAN GEVA, um dos maiores peritos mundiais em marketing, convidado a falar sobre dois temas: “Portugal destino de excelência – TURISMO DE SAÚDE E BEM ESTAR – QUE FAZER?” e “Porto! Uma marca para o mundo!”. Quem assistiu, considerou excelente o conteúdo das informações que nos foram trazidas por esse guru norte americano e vários presentes nas conferências, de algum saber de experiência feito, concluíram que neste país se vai por um caminho errado e urge mudar de estratégia se algum dia quisermos tirar a cabeça debaixo de água. Outros não perceberam nada. Muitos, responsáveis no aparelho da administração pública ou autarcas, que todos pagamos, primaram pela ausência. Também os autodesignados “notáveis”(!?) do Porto fizeram sentir com a sua ausência a soberba do seu egoísmo, da sua ignorância e do seu desprezo por tudo o que não vai no sentido dos seus interesses individuais. A comunicação social, tirando a honrosa presença da RTP1 e do jornal “Vida Económica” – cada vez mais claramente um exército de mercenários estúpidos – fez ouvidos de mercador aos eventos.

Feliz o país que tais filhos… tem!

Adiante, porém que se faz tarde.

Na espuma dos dias recentes e no contexto da visita assinalada, outras situações vieram fundamentar a razão de ser das perguntas com que iniciei esta crónica. Escolho sublinhar as seguintes:

1. No hotel, na baixa do Porto, onde ficou instalado o convidado do Forum Portucalense, só é possível atender uma chamada telefónica de cada vez. A esposa do Sr. Ilan Geva passou horas a tentar falar para esse hotel sem sucesso!

2. À partida para um cruzeiro no Douro – e apesar da empresa organizadora ter sido informada a respeito do viajante que iria acolher, - apareceu, apenas, tarde e a más horas, uma loira oxigenada, mas sobretudo malformada, a “despachar” para o comboio os turistas. Nem uma palavra de boas vindas, (nem qualquer outra) mas, antes, o desprezo por um trabalho que deveria ser exercido com particular cuidado.

3. Na programada (e acordada) visita a um espaço público marcante das artes, nem um passarinho cuidou minimamente de acolher o visitante. A pesporrência e negligência de quem o governa (?) fez-nos corar de vergonha.

E fico por aqui. Não sem sublinhar que houve também momentos a atitudes cativantes e do verdadeiro interesse de Portugal: do Sr. Doutor Manuel Teixeira (Secretário de Estado da Saúde); do Sr. Prof. Agostinho Cruz (Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto); do Sr. Prof. Salvato Trigo (Universidade Fernando Pessoa); do Sr. Dr. Laranjeira Pontes (Instituto Português de Oncologia do Porto); do Sr. Prof. António Ferreira (Hospital de S. João); do Sr. Dr. Paulo Sarmento e Cunha (Casa da Música); do Sr. Dr. Manuel Cabral (Instituto dos Vinhos do Douro e Porto).

Aos que vivem dos “tachos” com que o poder político paga favores e nada fazem; aos que vivem dos subsídios do Estado para não fazer nada e aos que já desistiram de lutar apenas peço que não vivam mais à custa dos que sacrificadamente ainda trabalham e lutam. Deixem a sociedade civil organizar-se e agir em liberdade num voluntário e gratuito prazer de construir um país novo.

Querem ir sem nós? Pois bem, nós seguiremos sem eles.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

quinta-feira, 9 de maio de 2013

ENTRE MUNDOS


Há sinais inegáveis de uma rutura com o passado.

As palavras que ora escrevo não serão mais do que palavras, porventura vazias, neste mundo que está virado de pernas para o ar. Escritos na água neste tempo opaco, rico em incertezas e prenhe de riscos que vem marcando uma etapa mais do trânsito da humanidade.

Há sinais inegáveis, porém, de uma rutura com o passado que nos colocam perguntas fortes e para as quais não alcançamos respostas, ou apenas algumas respostas frágeis, precárias.

Uma nova era marca já o nosso tempo. Não se trata de um mero tempo de mudança, mas de uma transformação radical, que vai às raízes das nossas vidas e as muda completamente. No entretanto desmembram-se continuidades que parece terem imperado no passado. Vejam-se alguns sinais. A Igreja Católica, que, quer se queira quer não, é um referencial incontornável da nossa mundividência, tem um novo Papa… ao lado de outro, dito emérito, mas que não deixa de carregar em si um certo passado que ainda é presente. Tão presente como o novo Papa Francisco, porventura o símbolo de algo novo, revolucionário mesmo. Não há, decerto, saber cientifico para perceber o que se passa e cada um tirará as suas ilações. Vale aqui, talvez, apenas aquela reflexão de Santo Agostinho: “Credo ut intteligam… intellego ut credam” (creio para poder entender… entendo para poder crer) – porventura um imprescindível apoio para nos situarmos neste conturbado mundo.

O processo austeritário em curso – e sem fim à vista – agrava cada vez mais a nossa condição de vida, ainda que, a alguns, esteja a trazer cada vez mais riqueza e poder. Não sairemos dele, porém, seja quando for, com o mesmo modo de ser ou de estar.

O crescimento económico é, por outro lado, a ilusão que, agora, parece despontar no céu negro entre os trovões.  Mas, nada estando assegurado, cabe, mesmo assim, perguntar: crescimento para quem? Crescimento de quê?

Entre a realidade e as promessas evidencia-se o desnorte que vai na vida pública em Portugal e no mundo. Na “Troika”, que nos oprime, uns acham que basta de punição e apelam ao crescimento económico, enquanto outros convocam e impõe uma ainda mais dura austeridade numa dualidade de posições que mostra bem o desvario que vai na cabeça dos políticos. Por cá, neste país que apodrece em cada dia que passa, acontece um governo com dois primeiros ministros (ou três, além de Passos e Portas … Gaspar)

Em casa onde não há pão (juízo) todos ralham e todos têm razão.

O início deste milénio há-de ficar na História como um tempo de mediocridade – de gente sem escrúpulos na governação pública; de ideias estúpidas e políticas experimentalistas; de falta de solidariedade e de egoísmo; de fome e de mal estar geral; de ausência de honra e de humanismo, também.

Em momentos de catástrofe é necessário projetar o pensamento para o período que se lhe há-de seguir e, daí, de novo, olhar com esperança o futuro. A isto se chama “catastrofismo esclarecido” (Jean-Pierre Dupuy, La marque du sacré: essai sur une dénégation, Paris, 2009) o que é algo que não tem sido objeto de devida atenção. Há que, com efeito, dizer a verdade sobre o presente sem minimizar o tamanho da catástrofe que se abateu sobre nós, mas lançar, também, pontes para o outro lado.

Os livros já foram todos lidos e as teorias são todas conhecidas da generalidade dos “mestres” que governam este tempo. Só falta, agora, dar um “jeitinho” e assumir uma ideia sobre Portugal – que não é um mero gabinete em Bruxelas, Nova York ou Berlim com janela para a província.

terça-feira, 23 de abril de 2013

O DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO E O ESTADO


Há muitas “mangas de alpaca” que parasitam a administração pública onde,tantas vezes, nada mais fazem do que criar dificuldades para vender facilidades.

O Governo está a mexer, inquieto e instável. Saem e entram governantes como crianças dos carrinhos de um parque de diversões. A U.E.  não está mais serena e, a “Troika”, comporta-se como uma barata tonta ao acabar, finalmente, por perceber que os seus remédios (ditas ajudas) são piores que receitas de bruxa.

A austeridade, cega, surda e muda, matou muitas esperanças e instalou o medo entre os portugueses; levou fome a muitos lares e a morte a muita doença. Foi um castigo, uma punição, que, vê-se agora, não tinha, nem tem, qualquer justificação económica. Tratou-se um mero ato de  terrorismo financeiro perpetrado por intelectuais de pacotilha, pretensamente cientifico (experimental), baseado em falsidade (ideologicamente programada?) de dois economistas, Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart, agora desmascarados (cfr. na net “Does High Public Debt Consistently Stifle Economic Growth? A Critique of Reinhart and Rogoff").

A agenda da austeridade irá ser, agora, reavaliada, mas isso já chega tarde demais para compensar tanto sofrimento. E não é certo que mude a mentalidade tacanha de certos políticos que, depois de lamberem alguns manuais ou revistas, se julgam donos da verdade absoluta. Pobres estrangeirados!

Austeridade, palavra trágica do nosso presente, mais do que marca do que é rigoroso, rígido nos princípios, comportamentos, ou hábitos (e de que precisamos), afirmou-se como sinónimo de empobrecimento e, sobretudo, de mortificação (que não merecemos) imposta de fora. Na economia significa rigor no controlo das despesas e gastos e é necessária quando a dívida pública e o défice se tornam insustentáveis. Mas, pela pouca inteligência de uns quantos bárbaros vestidos à homem e servidos à mesa por submissos criados portugueses - que puseram ainda mais pimenta na comida, - foi vista como “via única” num discurso dogmaticamente fechado: ou a “Troika” ou o caos.

Agora os mesmos trogloditas das finanças, lá fora e cá dentro, renovaram o seu discurso e falam-nos de reindustrialização e relançamento da economia. Acredito que seja verdade pela simples razão de que alguns já estão a abandonar o barco e a regressar aos seus gabinetes de consultores, advogados, “facilitadores”… onde tinham deixado a render o capital da sua estadia no Governo. Cometam os erros que cometerem, ou já cometeram, espera-os, cá fora, o perfume dos grandes negócios. Durante a política os negócios sempre continuaram, afinal!

O desenvolvimento económico parece que vai passar a ser um novo amanhã que canta. Antes isso, que o dobre afinados que marcou o passado recente. Todavia mais cortes se anunciam ainda na despesa pública (… como era bom suspender o Tribunal Constitucional, ou acabar mesmo com ele!) que afetarão as despesas sociais e, também, os trabalhadores da administração pública. Um drama acrescido no caso do Estado social, mas uma relativa necessidade no segundo. Não me refiro a professores, médicos, enfermeiros, juízes, mas, apenas, aos milhares de “mangas de alpaca”, ainda que com “canudo” (tipo Relvas ou outros), que infestam e parasitam a administração pública onde, tantas vezes, nada fazem do que criar dificuldades para vender facilidades. Também estes “custos de contexto” terão de ser eliminados. E, para tal, deixo aqui uma nota que nem tem nada de original embora seja politicamente incorreta para muitos: tudo o que a lei não proíbe é permitido. Este principio vale no Reino Unido, em França… mas não na Coreia do Norte. Seria, então possível retirar o Estado de Institutos, Comissões, e outros organismos de controlo prévio da legalidade desde um projeto de uma moradia, à licença de uma indústria ou à abertura de um restaurante. A Lei regularia os termos e condições da iniciativa que se imporiam, por si, aos interessados. Se não fossem cumpridos, então, accionar-se-ia o poder judicial para punir eficazmente os responsáveis.

Quantos trabalhadores poderiam, assim, deixar de estar à mesa do Estado e passar a fazer qualquer coisa de útil?