quinta-feira, 8 de novembro de 2012

SALVAR O ESTADO SOCIAL E AINDA GANHAR ECONOMICAMENTE COM ISSO


Com alguma lucidez e sentido estratégico em vez do naufrágio poder-se-ia, porém, criar uma enorme oportunidade de negócio.

Em crónica anterior já me referi ao tema atualissimo das funções do Estado e à necessidade urgentíssima de o debater e de definir a respetiva doutrina a longo prazo. Do caleidoscópio de questões que emergem desse tema refiro-me, aqui, ao Estado social que uns querem desconstruir e, outros, gritam que não aceitam que dê qualquer passo a trás.

Apesar da crise violenta que nos dobra a espinha e da austeridade que já nos leva a vida, será possível manter o Estado social (o modelo social do Estado) previsto na Constituição da República e de que, ainda há pouco beneficiávamos? Respondo, sem hesitação, que é possível além de ser necessário. E, acrescento, poder-se-à fazer assentar nele até uma estratégia de desenvolvimento para o país.

Vou explicar-me.

Não tem sentido útil rever e redesenhar as funções do Estado sem um desígnio para o país. Tais funções implicam com esse desígnio e a estratégia para lá chegar e não será admissível que se restrinjam às questões do défice e da despesa pública. Se assim for – como tem sido – iremos parar todos a uma situação na qual nem de Estado precisaremos…

O Estado social tem a ver com os direitos, constitucionalmente consagrados, à segurança social e à saúde, sobretudo no que ora interessa, sendo certo que o seu perímetro é mais largo. Não será possível alcançar uma sociedade coesa e solidária, virada para o futuro, sem que tais direitos sejam usufruídos amplamente por todos. A ideia de democracia, na vertente social, exige-o, de resto.

É caro manter os sistemas de segurança social e de saúde? É. E em tempos de crise económica e financeira é difícil? É. Temos, todos, de o pagar? Temos. Queremos mantê-los? Creio que a resposta é sim, não importa se como prestações diretas do Estado ou entregues à economia privada quanto a sua gestão. Ao contrário do que se possa pensar não estamos, porém, perante a quadratura do círculo mas, apenas, incompetência e preguiça a rodos, além, é claro, da incapacidade política de afrontar os interesses das corporações, nacionais e estrangeiras, do setor.

Com alguma lucidez e sentido estratégico em vez do naufrágio poder-se-ia, porém, criar uma enorme oportunidade de negócio. É que, sendo o Serviço Nacional de Saúde português um dos melhores do mundo (noutra ocasião falarei da segurança social) poderia “exportar” uma infinidade de bens e serviços, em que há mais valias, portuguesas, para outros países. Lembremo-nos, nomeadamente, dos países africanos de língua portuguesa em que não existe Estado social mas a ambição de o edificar é grande e urgente. Com espírito de solidariedade – que não tem porque excluir a justa retribuição – resultariam daí rendimentos que poderiam mais de que sustentar o nosso SNS. Se o não fizermos já, outros o vão fazer por nós e, indubitavelmente, com custos muito superiores para esses países porque em espírito meramente mercantil.

Volto às funções do Estado. O que mudar, então, no sentido de melhor aproveitamento do que já temos? Não é preciso desconstruir o SNS: o que urge é incrementá-lo, valorizá-lo, dignificar os seus profissionais e, sobretudo divulgá-lo ao mundo como marca portuguesa. Na vertente dos PALOP’s, decerto, mas não só porque há mais mundos a explorar. O turismo de saúde é um deles, bem como a prestação, em Portugal, de cuidados de saúde aos portugueses da diáspora. Estes beneficiam de seguros de saúde ou têm direitos face aos estados de acolhimento que permitiriam tratar-se em Portugal pagos por esses sistemas. E todos lucrariam.

Não estarei a dizer nada de novo, mas de novo apenas. Ainda há dias li na imprensa que o “O Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra foi escolhido pela segunda maior caixa de saúde pública da Alemanha, com oito milhões de inscritos, para tratar todos os seus beneficiários que adoeçam durante a permanência em Portugal. (Expresso, 27 Out. 2012). Não se sabia que era impossível… e, por isso, conseguiram-no!

Em vez de se autoreduzir e destruir as nossas vidas o Estado português tem de ser criativo.

E se começasse por aqui?