segunda-feira, 13 de julho de 2009

A VONTADE POPULAR

Em tempo de preparação de programas eleitorais, seria profundamente democrático que os partidos políticos que pretendem submeter-se ao sufrágio eleitoral integrassem nesses programas ideias, concepções e esquemas de solução para os problemas da coisa pública que levassem em conta, também, um núcleo fundamental de valores caracterizadores da identidade nacional, mesmo que, proventura, pouco rentáveis em termos de votos.

Já não consigo mais ver o meu país sem fulgor, num leito de moribundo, ligado a máquinas por todo o lado, na esperança de que se mantenham, apenas, os mínimos sinais vitais e apenas isso.
Todos querem, aparentemente, combater a crise, mas há qualquer coisa, algum fatalismo, porventura, que nos amarra ao chão e não deixa ver mais longe nem ir mais além.

Todos parecem ter, convenientemente, soluções para não deixar falhar definitivamente este velho Estado soberano, mas, envolvidos em negócios de mercearia e de má língua, não se viabilizam consensos mínimos em torno de uma estratégia para Portugal.

Todos, e ninguém.

Enquanto isso, em tempo de campanhas eleitorais, os partidos que nos calharam em sorte, vão procurando instrumentalizar a vontade popular numa cega luta por votos, deixando simplesmente à margem a mínima reflexão, sequer, sobre a vontade nacional, os grandes interesses e valores pátrios que não são de hoje, mas de sempre porque marcam fundo a alma da nação e muito para além de quaisquer gerações, mesmo futuras. E hoje tem, de novo, sentido falar em vontade nacional – mesmo sabendo que Salazar a invocava para manter um Estado totalitário – pois o sistema democrático em que assentam as actuais instituições da República revela fragilidades preocupantes, desde logo no desinteresse e alheamento dos cidadãos relativamente aos momentos eleitorais. Quando, de facto, mais de metade do país se alheia das escolhas políticas que periodicamente o sistema lhes proporciona, sempre fica a dúvida a respeito do que será a vontade nacional, que não a popular, ou seja, a que é expressa. E, daqui decorrente, emerge a questão do sentido e finalidade dos partidos políticos enquanto meras câmaras de ressonância dos interesses que se expressam nos votos e não da vontade de toda a nação. Porque os partidos se organizam, hoje, meramente para recolher votos – mais votos do que os outros – e daí que lhes interesse, apenas, agradar, nas propostas que apresentam ao eleitorado, quanto àquilo que quererão ouvir os que vão votar.

E os outros cidadãos?

Não sendo o voto obrigatório no nosso sistema eleitoral, na abstenção poderá acolher-se, de algum modo, a vontade nacional, nomeadamente quando a vontade expressa pelo voto, relativamente à totalidade dos eleitores, seja quantitativamente menos relevante do que a abstenção.

Não se ignora, naturalmente, que o conceito de vontade nacional tem muitas e diversas leituras, valorações e conotações políticas. É, porém, inegável que, além da vontade que os votos expressam, outra existe, não expressa. E uma democracia sã não se poderá alhear desta questão, antes lhe cumprindo encontrar os necessários e convenientes instrumentos para que uma e outra vontade coincidam o mais que seja possível.

Não se poderá, pois, aceitar que a força minoritária dos votos seja, sem alternativa, a lei e o direito; nem admitir, sem crítica, a desconsideração dos interesses e dos valores morais que não se expressem em votos.

Ora, em tempo de preparação de programas eleitorais, seria profundamente democrático que os partidos políticos que pretendem submeter-se ao sufrágio eleitoral integrassem nesses programas ideias, concepções e esquemas de solução para os problemas da coisa pública que levassem em conta, também, um núcleo fundamental de valores caracterizadores da identidade nacional, mesmo que, proventura, pouco rentáveis em termos de votos.

Alguns dizem que quem cala consente, mas não é assim. Quem cala apenas não diz nada. E há silêncios terríveis – como o que se expressa na abstenção eleitoral da maioria da nação.

Sem comentários: