quarta-feira, 7 de maio de 2014

AS ILHAS DO PORTO – UM PATRIMÓNIO HISTÓRICO PLENO DE FUTURO



Cresce quotidianamente o investimento privado no comércio e na indústria do turismo dedicados aos novos utilizadores da cidade. É aqui que surge a possível mais-valia das ilhas do Porto.

Chegam notícias de que, no Porto, se começa a olhar com alguma atenção para um património, tão dramático, física e socialmente, quanto singular, que são as chamadas “ilhas”. O tempo chega sempre, mas, às vezes, não chega à tempo… Oxalá haja muita esperança.
O Porto passa, nesta segunda década de 2000, por uma frenética reabilitação em múltiplos aspetos do centro da cidade que o turismo “low cost” descobriu e alimenta. Seja uma moda, ou algo para ficar, o certo é que cresce quotidianamente o investimento privado no comércio e na indústria do turismo dedicados aos novos utilizadores da cidade (city users).
É aqui que surge a possível mais-valia das ilhas do Porto numa estratégia de apoio, também, ao turismo nas suas múltiplas dimensões.
Sabemos que a ocupação residencial na forma de ilhas é um modo de habitação dos operários ligados à Revolução Industrial – um processo de industrialização que se iniciou no Reino Unido em meados do século XVIII e que transformou o modo de viver, as relações económicas, o trabalho, em torno do capitalismo industrial. Portugal acompanhou esse movimento, como tantos outros, porém, de longe, escassa e tardiamente, sendo que foi no Porto e na sua região que esse processo mais se refletiu (ver José Manuel Pereira de Oliveira, O espaço urbano do Porto: condições naturais e desenvolvimento e François Guichard, Porto, La ville dans sa région).
As guerras que destroçaram a Europa, sobretudo as duas guerras mundiais, destruíram pela Europa fora os traços desse tempo em que as cidades industriais sugavam trabalhadores dos campos e os agrilhoavam nas nascentes cidades industriais à volta da fábrica taylorista-fordista. A história evidencia este fenómeno e a do Porto e subúrbios deixa algumas referências, também a este processo.
Acontece que, entre nós, quer por fatores históricos (as grandes revoluções e as guerras mal chegaram ou passaram ao lado do país) quer pela inércia política, quer pelo persistente atraso económico, as ilhas do Porto ainda aí estão na nossa “modesta cidadezinha” (Virgílio Borges Pereira e João Queirós, Na “modesta cidadezinha”. Génese e estruturação de um bairro de “casas económicas” do Porto [Amial, 1938-2010]). Recorde-se, de resto, com estes autores, que “dificilmente deixará de se concordar que a história das “políticas de habitação” no nosso país não começa realmente senão em 1933, ano de criação do Programa das Casas Económicas” (p. 11)
Ora bem. O desafio que nos cumpre enfrentar é o de ir à procura das ilhas existentes na cidade e pô-las no mapa de uma nova economia, virada para o mundo global em que vivemos e, sobretudo, tendo em conta as “classes criativas” que já estão presentes no presente e buscam o seu espaço.
A criatividade humana é, porventura, o último recurso que temos à nossa disposição para enfrentar os desafios do futuro (cf. Richard Florida, The rise of the creative class e Who’s your city?)
Nos limites deste espaço onde escrevo, resta-me adiantar uma singela proposta que poderá ser fundamentada por qualquer interessado em ir mais longe nos livros referidos. Perguntarei, então: por que não reabilitar, mantendo tudo o que for possível no seu específico tempo histórico, essas ilhas mas com novas funcionalidades? Poderiam ser afetadas a residências de estudantes – dos programas de intercambio europeu Erasmus por exemplo e internacional (os estudantes dos países lusófonos); à instalação de empresas e atividades artesanais, livrarias, atividades musicais, à publicidade, à arte, ao design, à moda, a antiguidades, entretenimento, restauração… que sei eu?
Terá chegado o tempo de voltar aos valores do passado com significado e força no futuro?
Acreditando que sim, por aqui iremos caminhar.

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