Obrigado, muito obrigado por ter partilhado connosco o riso, a dor, a esperança, a angústia, os
… E todos, todos
se vão!
Osíris, o deus
do Além, passou, na sua barca, à porta de Nuno Grande e levou-o, há dias,
consigo. Vai chegar primeiro, Professor. Espere por nós, os que sempre e
incondicionalmente em si acreditamos e que continuaremos, entretanto a combater
por cá de olhos postos em si.
Homens como Nuno
Grande, num mundo agreste, cínico, egoísta, desnorteado, ganancioso, levam-nos
a pensar que a natureza humana não é necessariamente má e o “homem o lobo do
homem” (homo homini lupus, Hobbes).
Há, afinal, outros caminhos na sociedade que podem ser percorridos na senda da
liberdade, da igualdade e da solidariedade. Foi por estes que a luz da sua vida
viajou com uma grandeza infinita. E fica entre nós.
Lembro, neste
momento, em especial a sua dedicação à Fundação Afro-Lusitana e o apoio
constante que generosamente lhe prodigalizou para a manter viva na ajuda a estudantes
dos países africanos de língua portuguesa. E se em muitas outras circunstâncias
tive o privilégio da partilha da sua bondade (Forum Portucalense, Liga dos
Amigos da Ponte D. Maria, Centro Juvenil de Campanha, sei lá que mais!) convoco
aqui a Fundação Afro-Lusitana para, em jeito de homenagem – e até ao nosso
encontro no Oriente eterno – lhe prometer que a fundação que tanto lhe deve vai
voltar a ser o que queria que fosse. Vai, sim, Professor. Porque era sua
vontade e é a nossa, segundo os seus ensinamentos.
Com este humano
evento – o seu e o nosso adeus – mais uma noite sem lua acontece na nossa
impiedosa sociedade que, cada vez mais desumanizada, caminha a passos largos
para a tragédia final – suspensa a democracia, uma certa liberdade poderá fazer,
a seu tempo, retornar o fascismo. Não devia, pois, deixar-nos por aqui quando
vivemos num país agrilhoado por poderes não eleitos e mortificado por eleitos
imbecis; quando há crescentemente fome em muitos lares e a saúde deixou de ser
um direito humano incontestável; quando a mediocridade e o oportunismo estão encavalitados
à mesa do Estado; quando a liberdade se esvai e a democracia apodrece; quando o
medo escraviza os portugueses; quando a esperança já não nasce ao raiar do dia.
Afinal foi contra toda esta miséria que os seus valores sempre o levaram a
lutar corajosamente!
Ao curvar-me
perante o seu corpo biológico na capela mortuária onde descansava, a sua extremosa
esposa - grande Mulher sempre ao lado de um grande Homem – olhou-me e, entre
lágrimas, sussurrou-me ao ouvido: “Sabe, ele gostava muito de si”. Agradeci
comovido e sem jeito. Mas o Professor gostava de todos e a todos ajudava numa
permanente disponibilidade para fazer o bem sendo eu apenas um dos devedores
que ele deixou e que não teve, ainda, ocasião de lhe pagar a sua generosidade.
Nuno Grande, não
viveu no, e do, materialismo vulgar que ignora a singularidade de cada pessoa e
a dignidade humana de todos. Homem aberto à totalidade do real percorreu
caminhos diversos com um humanismo insuperável na busca permanente de mais
liberdade, mais democracia, mais justiça, mais dignidade. E com a esperança
meta-histórica (estou disso convencido) de que para além do tempo, tempo
haverá, deixou sinais e marcas nos caminhos que sulcou na sua terrena peregrinação
que farão avançar no futuro os homens de boa vontade como ele o foi
Obrigado, muito
obrigado por ter partilhado connosco o riso, a dor, a esperança, a angústia, os
afetos, o sonho, o amor e a morte.
Até logo,
Professor.
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