quarta-feira, 31 de outubro de 2012

AS FUNÇÕES DO ESTADO


Debater as funções do Estado – e o seu custo e modo de pagamento – é tarefa ciclópica, mas incontornável face às grandes transformações nos “mundos da vida” que a crise de 2008 nos vem colocando no caminho.

O ministro Vítor Gaspar tocou um dos temas mais relevantes para os portugueses quando afirmou recentemente na Assembleia da República que “aparentemente existe um enorme desvio entre aquilo que os portugueses acham que devem ser as funções sociais do Estado e os impostos que estão dispostos a pagar”. Ao exprimir-se através do advérbio “aparentemente”, mostrou que não estará seguro da sua declaração, mas creio que a questão é muito pertinente e deverá ser objecto da maior atenção. Não esqueço, também, que num livro recentemente publicado, coordenado por Raquel Varela, com o título “QUEM PAGA O ESTADO SOCIAL EM PORTUGAL – onde nos leva esta crise económica? O Estado de bem estar europeu tem futuro? Dívida pública: dívida de todos ou negócio de alguns?” se conclui, com importantes fundamentos, que são os contribuintes quem paga o Estado social e não o estrangeiro.

Debater as funções do Estado – e o seu custo e modo de pagamento – é tarefa ciclópica, mas incontornável face às grandes transformações nos “mundos da vida” que a crise de 2008 nos vem colocando no caminho. Há que perceber que um mundo acabou e outro está a nascer, uma nova era certamente e não uma qualquer mudança superficial ou conjuntural.

Naturalmente que se sente mais na pele a problemática do Estado social pois toca prestações e serviços a que todos se habituaram como “coisa normal”, assim como se fosse um maná vindo dos céus na euforia de Abril e para ficar para sempre. Deve sublinhar-se, porém, que a problemática é muito mais vasta entroncando-se, nomeadamente, com aquilo que se designa por “Conceito Estratégico de Defesa Nacional” – algo que anda, de resto, demasiado longe, infelizmente, das preocupações governamentais, o que se há-de pagar um dia destes. E, também, com as escolhas, com mais de oitenta anos de aprofundados estudos e debates, quanto à intervenção do Estado nos mercados. (Ver a propósito, de Nicholas Wapsshott, Keynes/Hayec – o confronto que definiu a economia moderna, D. Quixote, Setembro 2012). Mais despesa pública ou, ao contrário, mercado livre, é este o nó gordio também da saída para a crise. O Estado, sempre, no centro do furacão.

A Constituição de 1976, ainda que revista em diversos momentos, exprimiu a vontade política do povo português num certo momento. Os Constituintes consagraram, todavia, apenas as ambições – que fixaram em direitos – dos seus representados ignorando, majestaticamente e com o tradicional populismo, as obrigações que deveriam corresponder aos direitos. Depois se veria, terão pensado…

Hoje é chegado o momento de fazer contas. Sublinhe-se, porém, que as escolhas não são apenas do foro financeiro, ao contrário do que, por vezes, se quer fazer crer. São ideológicas – têm a ver com as funções do Estado, as suas finalidades.

As promessas primeiras incluídas na atual Constituição estão a ser destruídas antes, mesmo, de terem sido plenamente alcançadas numa manifesta crise de representação do futuro.

O povo português, à luz dos tempos novos que vivemos, deverá ser chamado a pronunciar-se sobre as propostas que os partidos venham a apresentar quanto ao Estado que pretendem e, aí, terá de lhes ser dito o respetivo custo. Só assim se podem pedir sacrifícios e impor austeridade e, sobretudo, só nesse contexto se pode pedir que todos lutem para que o futuro seja melhor para todos.

Não é possível por muito tempo sustentar, pelo medo, o atual estado do país.


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