Solidariedade é necessária. No nosso país, na U.E. e no mundo.
Apresenta-se a crise financeira, económica e social que atravessamos como um efeito de erosão de valores sociais, culturais, identitários e de coesão nacional. Sem negar tal realidade, impõe-se perceber, desde logo, que essa erosão de valores é muito anterior ao despoletar da actual crise e, por outro lado, que também ela contribui – e muito – para tal crise.
O desprezo dos valores esteve na origem da crise que nos submerge, e, esta, só poderá ser ultrapassada com valores.
«Na realidade, e na verdade, “os valores” são grandes ideais sociais, depositados na forma universal do conceito – e sedimentados ao património cultural que envolve a deriva das condutas e dos comportamentos – como horizonte (normal) de regramento. São o produto de um trabalho – demorado, complexo, e sinuoso – da consciência social (de gerações, de comunidades de interesse) que, por eles e neles, do mesmo passo que reflecte (na sua facticidade, potencialidade, e anseios) todo um ser social internamente modelado pela contradição, procura igualmente ganhar uma imagem de si própria (para consumo interno, e uso externo), e ainda perspectivar a sua própria condição, ou situação, em termos de um projecto prático de realização histórica – nacitoriedade do acontecer, ou na escatologia de um «Além»”. (José Barata Moura, Valores e Crise).
As transformações que, nas últimas décadas, têm feito vacilar as nossas vidas, levaram-nos para territórios novos, mas não nos preparamos com anterioridade para isso, antes desconstruímos os ideais sociais que nos trouxeram até recentemente sem que nada os tenha substituído. Não sabemos para onde vamos, que ambições, valores, levar na bagagem, e caminhamos sem bússola rumo a qualquer sítio, que nem sabemos onde é. O efémero é o nosso deus, a obsolescência acelerada de qualquer princípio ético é a nossa companheira de viagem, a frivolidade dos valores é-nos indiferente, o consumismo desenfreado a nossa lei.
Não sei – quem sabe? – se será possível perspectivar valores novos, designadamente de tipo espiritual, mas tenho a convicção de que alguns, sejam novos ou não, tem de alicerçar o nosso destino. Com carácter de urgência.
O mundo como está, dominado pela finança gananciosa, por interesses económicos sem regras nem ética, por ideias materialistas, individualistas e narcisistas, pelo hedonismo e pela urgência da satisfação imediata de qualquer tipo de ambições não tem devir. Acreditar que vai emergir outro paradigma é não só uma questão de fé, mas, também, de sobrevivência.
Ainda esta semana, no relatório Trade and Development 2011 (Comércio e Desenvolvimento 2011), divulgado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), essa organização sublinhava que a consolidação das finanças públicas só responde aos “sintomas do problema” e não às suas causas profundas, acrescentado que o desenlace é de prever – “um risco significativo de gerar um período prolongado de crescimento medíocre nas economias desenvolvidas – se não mesmo de contracção”.
Certamente que Portugal, um pequeno país semi-periférico (na Europa que não no mundo atlântico) não terá os meios nem os instrumentos suficientes para obviar aquele referido desenlace. Mas pode ser um farol, assim todos nós o queiramos.
De qualquer modo os “outros”, os que estão a engordar financeiramente à custa da crise e, em particular, da calamitosa situação portuguesa, talvez devessem pensar que sem economias pujantes (a galinha) mais tarde ou mais cedo vão deixar de contar com os rendimentos da nossa austeridade (os ovos). E depois?
Solidariedade é necessária. No nosso país, na U.E. e no mundo.
Os momentos maiores da História foram sempre aqueles em que se privilegiou o Homem. É esse, também, agora, o desafio.
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