A crise impõe - se se pretende vencê-la – que os Estados europeus redefinam os seus projectos a médio e longo prazo, bem como, se o têm o seu projecto comum.
Há muito que a Europa vive sem glória e sem um grande desígnio, desfeita em migalhas de poderes, e continuamente a assobiar para o lado face aos gravíssimos problemas que se lhe vão deparando. Indecisa, envolta em nevoeiro, não sabe já quem é, nem o que quer vir a ser, parecendo, apenas, esperar, em pânico, pela emissão da sua certidão de óbito.
Enquanto a crise económica e financeira se agrava, na UE e um pouco por todo o Ocidente, começa a instalar-se na mente de muitos a ideia de que a Europa irá conhecer um declínio comparável, provavelmente, à lenta queda do Império Romano. Do enfraquecimento da ética e da moral, ao cinismo dos ricos, passando pelo medo dos “bárbaros”, as analogias não faltam. E tudo se complica pela falta de ideias e de líderes capazes de estabelecer um rumo contra o processo de agonia vigente.
Ainda será possível salvar-se a Europa? Um grande número de intelectuais vem se juntando já à cabeceira do “Velho Continente”, moribundo, soltando lágrimas de crocodilo enquanto outros propõem, apesar de tudo, várias possibilidades para um outro futuro político para a Europa, no sentido de contraditar o declínio. Mas terão de ser, antes de mais, os povos e não os políticos a querer relançar a construção europeia. E esta não é uma causa que seja partilhada, na hora actual, por todos os povos. A evidencia dos factos até aponta em sentido contrário.
A crise impõe - se se pretende vencê-la – que os Estados europeus redefinam os seus projectos a médio e longo prazo, bem como, se o têm o seu projecto comum. Se querem ter uma hipótese de sucesso terão de lutar, antes de mais, por uma solidariedade financeira entre os Estados membros. Os governos, por seu turno, não se podem contentar em apenas reagir aos caprichos dos mercados, administrando uma qualquer terapêutica paliativa, nem poderão, também, continuar a cingir-se à implementação de um simples código de boas práticas financeiras pois o equilíbrio orçamental não pode ser apresentado como única finalidade e, mais austeridade sobre austeridade, nunca poderá ter sucesso, bem pelo contrário. Terão, por isso, de dar outros passos e dizer aos eleitores europeus para onde é que os querem guiar. E, é urgente reagir, porque enquanto imperarem os interesses das agências de rating e os dos seus gananciosos investidores o desemprego manter-se-á num nível muito elevado, a crise social agravar-se-á e o populismo político prosperará à custa da acumulação dos custos sociais da crise.
Portugal, à sua dimensão, terá também que defender causas relacionadas com o futuro europeu. Temos, também nós, de olhar para a UE de outros sítios, talvez mais improváveis, para nela ver mais do que um qualquer organismo distribuidor de dinheiro fácil tal como tem acontecido até agora.
Temos (como referia recentemente Eduardo Lourenço) de nos ler e de nos lermos na Europa com uma intensidade e profundidade que nunca antes tivemos e sem ceder à tentação da preguiça, ou iludindo-nos ao apontar para os “outros” todas as culpas pela situação actual e deles, apenas, esperando (sentados) soluções milagreiras.
Afinal somos Europa, ou não?
E pretendemos continuar a sê-lo, ou temos alternativas neste mundo globalizado?
E o que estamos dispostos a fazer e a dar por essa Europa que, além do mais, precisa de se redefinir constitucional e programaticamente?
Seria bom que o debate sobre a Europa tomasse efectivamente conta do nosso espaço público. Tal poderia, pelo menos, ajudar-nos a sair da angústia existencial presente e a pensar num futuro de grandeza para a nossa civilização milenar de europeus.
Há carpideiras a mais neste tempo enquanto se expande uma austeridade estúpida, indecente e desumana.
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