A política externa francesa não será exemplar vista numa perspetiva
histórica e crítica. Dizer-se, porém, que o oportunismo é a “imagem de marca da
diplomacia francesa no mundo” é dar um salto mortal.
Devo adiantar
que tenho muito apreço pela coragem e pela lucidez do Dr. Miguel Sousa Tavares
assente, nomeadamente, em quanto tem escrito sobre a vida política num país em
que proliferam, nesse ramo, muitos invertebrados. O pai – que conheci enquanto
deputado na Assembleia da República – era da mesma fibra, de “antes quebrar que torcer”, e foi, para
muitos, um exemplo invulgar de cidadão e de político. Para mim foi.
Ao ler a sua crónica
“Uma política externa que nos envergonha” na última edição do Expresso (5 julho
2014), chocou-me, porém, como poucas vezes antes, aquela sua comparação entre a
“política externa de países como a Suécia
ou a Noruega ou a de um país como a França, onde noções como a ética, a justiça
e a verdade são substituídas por um oportunismo e uma falta de princípios de
toda a ordem, que são a imagem de marca da diplomacia francesa no mundo”.
Tal comparação
é, desde logo, despropositada pois não se vê justificação para introduzir uma
crónica – no demais pertinente - com tão
cortante afirmação. Aberratio delicti?
– acidente ou erro na narrativa que levou a resultado diferente do pretendido?
Além disso é tão
vaga, tão generalista, tão a-histórica que denota ignorância de momentos axiais
da política externa francesa. Quantos enraizam o muito ou pouco que são na
cultura francesa, como é o meu caso, não podem sufocar um grito de revolta perante
tal declaração. E também aqueles que, nos anos sessenta do passado século,
foram acolhidos em França em tempo de fome de pão e de liberdade em Portugal,
decerto sentirão algo semelhante. Não havia necessidade, Dr. Miguel Sousa
Tavares, de ter ido por onde foi ignorando, concomitantemente, países com
política externa incomparavelmente mais acintosa e oportunista e de que nós,
portugueses, fomos (somos) vítimas indefesas e humilhadas. Saiba que as suas
palavras ofenderam, também, muitos portugueses dos quais não tenho procuração –
nem de ninguém – para falar, mas que, creia, ficaram perplexos, incrédulos face
à sua categórica afirmação.
As relações
entre Portugal e França são um assunto muito sério e relevante. É inútil e
perigoso, pois, tomar a nuvem por Juno, sobretudo num tempo de profundo
declínio da Europa e dos valores que, ainda há pouco, nos irmanavam na
construção europeia. De resto – e firmando-me no demais do seu texto – creio
que não temos lições a dar a ninguém!
A política
externa francesa não será, longe disso, exemplar vista numa perspetiva
histórica e crítica, como a não será, nessa mesma perspetiva, a de qualquer
outro Estado. Daí a dizer-se, porém, que o oportunismo é a “imagem de marca da diplomacia francesa no
mundo” é dar um salto mortal, sobretudo quando não se fundamenta essa
conclusão e, antes, se esconde a arrogância das palavras na pobreza do
conhecimento concreto.
É costume
dizer-se que por detrás de uma grande resposta há sempre uma grande pergunta.
Qual é a sua grande pergunta (ou questão), Dr. Miguel Sousa Tavares?
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