quarta-feira, 16 de julho de 2014

"ONDE ESTÁ O DINHEIRO?"



De país de brandos costumes, que não mata os toiros mas apenas os farpeia cristãmente, passamos a uma amálgama de indivíduos sem carácter para quem tudo vale e tudo tem perdão.

O vento que sopra há muito que não traz boas notícias para o país que somos. Às vezes até apetece, mesmo, pegar no vento e fugir deste lamaçal de intrujice e de pilhagem em que medra o poder e os seus cortesãos da finança à economia passando por labirínticas sinecuras politico-partidárias.

O “caso” do Grupo Espírito Santo – como pode um qualquer cidadão respirar neste nosso país sem se sentir por ele ética e politicamente asfixiado? – configura-se, aparentemente, como mais um caso de putativa associação criminosa. Os tribunais confirmá-lo-ão, ou não. Ou deveriam fazê-lo, mas…

Ora, ao abordar, no habitual estilo soap opera, a crítica situação ao redor do BES, o comentador político que neste país “lava mais branco”, foi interpelado pelo seu interlocutor no sentido de saber “Onde está o dinheiro?” – a pergunta que muitos, pelo menos eu, queriam ver respondida. Marcelo Rebelo de Sousa não respondeu e, até, fugiu expressamente à questão. Esta é, porém, a grande questão de todo este imbróglio político-financeiro a qual expressa o caos em que navega a vida pública portuguesa.

Não posso ignorar, como advogado interveniente em largas centenas de conflitos entre instituições bancárias e seus clientes, o facto de estes terem, num primeiro momento, sido seduzidos a consumir crédito dito a pataco. Tudo lhes era oferecido num inconsciente processo de endividamento cujos resultados têm vindo, desde 2008, à tona. Com a crise, instalada a austeridade (para alguns), a banca foi sempre, porém, acarinhada no espírito do neoliberalismo reinante. Enquanto os contratos que a envolviam com o poder político eram tidos por intocáveis, o cidadão comum viu os seus direitos, ainda que também contratualizados com o Estado – direito a pensões, retribuição e outros – serem destruídos pelo Governo da Troika ou a Troika do Governo.

Após esse momento de facilitismo, a banca, em geral, trocou a sedução pela reivindicação imoral do que alegadamente lhe pertencia e, então, iniciou-se o calvário, muitas vezes até ao último suspiro, de quantos haviam contraído empréstimos bancários. Insolvências sem fim e despejos sem limites foram, e ainda são, o preço que vai sendo pago por quaisquer empréstimos incumpridos.

Alguns banqueiros, em conúbio com interesses partidários inconfessáveis e seus servidores ou utilizadores, são responsáveis primeiros pelo desconcerto das finanças públicas. Muitos o sabem por experiência pessoal e, outros, por dever de ofício, mas ninguém tem coragem de ir ao âmago dos problemas e atacar o mal na raiz.

Se as autoridades seguissem o cherne, isto é, o itinerário dos dinheiros confiados e desbaratados por esses políticos-banqueiros apátridas talvez muito mais se viesse a saber sobre esta democracia folclórica em que nos debatemos sem um destino à nossa frente, com cada vez mais folclore e menos democracia.

De país de brandos costumes, que não mata os toiros mas apenas os farpeia cristãmente, passamos a uma amálgama de indivíduos sem carácter para quem tudo vale e tudo tem perdão. Venham mais uns milhões da UE e tudo o mais será esquecido.

Neste contexto é desolador, também, contemplar a passividade da Justiça. Lenta, incompetente (subtilmente desativada pelo poder executivo), mole, egoísta, já não é, como deveria ser, a esperança dos oprimidos.

Tudo isto é triste, tudo isto é fado!

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