A reforma do Estado não pode jamais ser reduzida a uma mera questão
financeira ou de preço de qualquer serviço.
Não será preciso
ser especialista em Direito Constitucional para se perceber que o poder
político instalado está a tentar levar a cabo uma revisão da Constituição da
República Portuguesa através de meios inconstitucionais. As sucessivas
declarações de inconstitucionalidade pronunciadas pelo Tribunal Constitucional
evidenciam-no à saciedade.
Uma Constituição
nunca é perfeita, nem será definitiva. Cada geração tem, de resto, legitimidade
para, através dela, traçar o destino que pretende que seja o seu. Há, porém,
direitos e deveres constitucionalmente consagrados que decorrem de princípios
que não poderão ser postos em causa sem hipotecar a dimensão humana de cada um
de nós e as maiores conquistas civilizacionais do nosso tempo.
Defendo a
necessidade e a urgência de revisão da nossa Constituição em múltiplos aspetos
à cabeça dos quais coloco o tema das funções do Estado e o da sua consequente
reorganização, mas não gostaria que essa revisão acontecesse no braseiro de uma
qualquer revolução. Creio, porém, que é para aí que estamos a caminhar.
O artigo 284º da
nossa Constituição determina a competência e o tempo da sua revisão e o artigo
288º os limites materiais do seu possível âmbito. O poder dos não eleitos – e
de outros, eleitos mas ao serviço daqueles – parece, porém, não obedecer a
quaisquer limites nem fronteiras, com o que a tese da revisão revolucionária
ganha, cada vez mais, possibilidade de acontecer. Também pelo lado dos
excluídos da dignidade de viver (e de morrer, até) a “revisão” revolucionária
pode deflagrar (quem já não tem nada a perder…) a todo o tempo. Se algum
ensinamento da história tem aqui acutilância, parece que poucas dúvidas deverão
entorpecer o necessário, mas fora de moda, patriotismo.
Quando quem
manda e comanda sabe o preço de tudo, mas não conhece o valor de nada, todos os
caminhos servem para chegar onde lhes interessa. A reforma do Estado – urgente como
já referi – não pode jamais ser reduzida a uma mera questão financeira ou de
preço de qualquer serviço, seja no Ensino, na Saúde ou em qualquer outra área.
Mas a tal tem sido limitada por uns quantos políticos que mais não sabem que
subtrair (para os outros), somar (pare eles), dividir (para reinar) e
multiplicar (para os amigos). Reformar o Estado implica muito saber
(ideológico, doutrinal, jurídico, sociológico…) e muito trabalho, sobretudo
muito trabalho.
Não vejo nas
instâncias do poder atual quem o saiba ou o queira fazer. Aliás o Dr. Paulo
Portas, porventura o menos mau num governo mais que frágil, já deveria ter
cumprido, há muito, a sua promessa de apresentar o pertinente projeto sobretudo
agora que é quem manda no Governo. Não o fez e, creio, nunca o fará. E ele sabe
bem porquê, tal como Passos Coelho e a sua idêntica promessa.
Na
impossibilidade de uma revisão constitucional segundo os princípios
democráticos previstos na própria Constituição, pretendem alguns fazer, hoje, avançar
uma revisão de fato (oculta) das normas constitucionais de que não gostam, ou
que não convém ao seu projeto neoliberal travestido de dívida pública, défice,
etc. A questão é, então, a de perceber e explicar que se os direitos, em tempos
de necessidade, têm de ser comprimidos ou suspensos o pertinente critério tem
de ser igual para todos (princípio da igualdade). E há que ponderar, também, se
não haverá direitos – como os Direitos humanos – que, de modo algum, poderão
ser violados, custe o que custar, em tempo algum. É evidente que a resposta só
poderá ser afirmativa. Ponto é que os interesses e a ganância de alguns o não
considere e, antes, continue a sugar sem escrúpulos, a vida de muitos.
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