É
no estrume do Estado que tudo providência a todos – sobretudo aos dependentes
de certos partidos políticos – que se gera a mediocridade e que soçobram os
melhores.
O melhor dos
mundos é o nosso, porque somos nós próprios que o podemos conceber e realizar.
Indigna-me, por
isso, ouvir dizer: “Isto só podia acontecer em Portugal”, “Portugal é um país
de corruptos”, “Lá fora é que é bom”, “Os portugueses não prestam para nada”, e
frases semelhantes.
Não é verdade,
desde logo. Não há povos ou nações quimicamente puros (embora haja no história
dramáticos momentos em que alguns nisso acreditaram). Em qualquer país há bons
e maus governantes, bons e maus governos, corruptos e malandros, empreendedores
e oportunistas. Não se entende, pois, este masoquismo nacional. E nisto não vai
nenhuma desculpa relativamente à mediocridade reinante que deverá ser apontada
e desmascarada (bravo! D. Januário Torgal Ferreira) sobretudo por quantos, de
boa-fé, tenham ideias e vontade de servir genuinamente o país mas não queiram
medrar nos esconsos vãos dos partidos que temos – o grande cancro da nossa
democracia.
Admita-se,
porém, por mero exercício de reflexão, que, de facto, nós, portugueses somos
uns enfezados. Ora mesmo aí só de nós nos poderíamos queixar porque nos
teríamos posto a morrer em vez de abraçar a vida, lutar pelos nossos direitos,
conquistar os caminhos do futuro.
Há um aspecto
decisivo que vem mesmo a talhe de foice e que tem marcado a nossa mentalidade.
É que exigimos sempre tudo ao Estado como se ele fosse o nosso pai. E quando
digo tudo, é tudo: até quando chove lhe exigimos sol, e quando faz sol lhe
exigimos chuva – ou, o que é o mesmo, subsídios para a falta de sol ou da
chuva.
É aqui, no estrume
do Estado que tudo providência a todos – sobretudo aos dependentes de certos
partidos políticos – que se gera a mediocridade e que soçobram os melhores.
Apresento um
exemplo. É inegável o valor de qualquer investimento na área cultural não sendo
preciso argumentos para o defender. Daqui resulta que qualquer agente ou grupo
que a tal se dedique – com valor ou sem ele – passa, em Portugal, o tempo a
berrar por subsídios do Estado e se eles não vêm a paisagem cultural
desertifica-se. Nos Estados Unidos, porém, o Estado pouco disponibiliza ao sector
– e não se diga que a cultura nesse país não é fascinante. Aí é a sociedade que
financia, através dos instrumentos do mecenato, aqueles que entende merecem
apoio. E para o merecer os peticionantes têm que mostrar o que valem e não,
apenas, colocar-se na linha de partida.
Nós,
portugueses, não somos piores (talvez não sejamos também melhores) do que
outros povos, mas estamos habituados a fiarmo-nos mais no Estado do que nas
pessoas. E quando o Estado está capturado por certos interesses obscuros – e
está cada vez mais – não é de esperar nada de bom.
A afirmação da
liberdade, da dignidade e da força dos portugueses tem de ser configurada não
no colo do Estado, mas contra o Estado.
O neoliberalismo
que avança sem rédeas na sociedade e também já tomou conta do nosso país,
apesar das suas políticas, por vezes dramáticas e desumanas, parece poder ter o
condão de chamar à razão e à acção muitos daqueles – ricos, pobres e remediados
– que dizem mal de tudo, mas nada fazem, eles próprios, por si e pelo seu país.
Seja como for, o
debate sobre as funções e a amplitude do Estado está entre nós. Pena é que não
haja cidadãos à altura do desafio e disponíveis para nele entrar.
Temos medo de
crescer. A nossa medida é a do “Portugal dos pequeninos”. Mas o futuro começa
hoje.
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