quarta-feira, 11 de julho de 2012

AS “OPORTUNIDADES” DO COSTUME


Pensava que as “Novas Oportunidades” tinham ido parar ao baú das “velhas oportunidades” e não se falava mais no assunto. Enganei-me.


A óbvia necessidade de qualificação dos portugueses levou o Governo de José Sócrates a lançar um programa para adultos  que ficou conhecido pela designação “Novas Oportunidades”.

Muitos o utilizaram e bastantes dele retiraram proveito, por entre as habituais trafulhices de alguns que dele se aproveitaram para enriquecer à custa do dinheiro fácil do Estado. Não ignoro que, por encomenda do Governo de Passos Coelho, o Instituto Superior Técnico procedeu a uma avaliação dos resultados desse programa e concluiu pelo seu reduzido efeito nomeadamente na empregabilidade e nos salários. As conclusões dessa encomendada avaliação foi muito contestada pela associação representativa dos profissionais implicados na sua implementação e nesse ensino que qualificaram o estudo (avaliação) como “enviesado”, um “embuste”, “ideologicamente preconceituoso”, e mais ainda. A habitual questão partidária de saber quem lava mais branco…

A partir deste breve histórico eu tinha concluído que as “Novas Oportunidades” tinham ido parar ao baú das “velhas oportunidades” e não se falava mais no assunto.

Enganei-me.

Por um lado, mudado o nome, o programa continuou, agora na linha da tabuada que orienta o atual governo, alegadamente direcionado para a formação profissional – o que, até, me parece acertado, mas não suficiente, para eliminar, como lixo, o programa do anterior governo. Por outro, vim a constatar a profunda paixão que alguns dos atuais donos do poder mantinham pelo defunto programa. Afinal o espírito das “novas oportunidades” paira sobre nós!

Claro que na base deste escrito está o “fenómeno” que dá pelo nome de Miguel Relvas (vem aí uma queixa crime, quem me vale?). O seu caso representa, com efeito, o regresso do espírito das novas oportunidades. Refletindo melhor: o espírito das “oportunidades do costume”, aquelas a que só têm acesso os poderosos, os espertos, os que correm mais ou falam mais alto. Os donos dos partidos políticos, afinal, e os seus cúmplices. Como professor universitário que sou há mais de trinta anos, por mim também passaram alguns caciques políticos, pobres ignorantes, mas ilustres distribuidores de prebendas e favores que, à custa disso, lá iam tirando os seus cursos. Um dia voltarei a este assunto e com nomes…

A Universidade Lusófona tem o direito – e tem competência – para atribuir títulos e graduar os seus estudantes. E não duvido por um segundo que Miguel Relvas, enquanto comerciante, (na nomenclatura jurídica), e, também, como jurista com loja de advogado aberta é uma sumidade. Mas não ficaria mal à Lusófona demonstrar a genialidade do rapaz. Estou certo que o faria sem dificuldade e, não o fazer, é um erro crasso. Eu próprio tenho lido e ouvido, em muitos quadrantes, que o seu saber e experiência em alguns setores – planificação fiscal internacional (off-shores), contratos difíceis e financiamentos fáceis, consultoria de negócios, joint-ventures transnacionais e atividades similares – são inatingíveis pelo comum dos mortais. E até deixo de lado “outros saberes” ligados ao ditado “o segredo é a alma do negócio”, o que, no seu caso, é uma extraordinária mais valia.

Uma coisa não percebo, porém. Porque é que “eles” querem todos ser engenheiros e doutores? Não perceberam, ainda, que nesta sociedade fluida, complexa e de alto risco – mutável a todo o instante -, esse “canudo” não significa nada, salvo se assente numa forte personalidade, na vontade de vencer e em espírito de sacrifício?

Deixem de ser provincianos, todos vós, Sócrates e Relvas, deste tempo de vésperas. Sejam grandes e inteiros, sejam autênticos, nada exagerem nem excluam do que são, ponham tudo o que são no mimo que fazem (Fernando Pessoa/Ricardo Reis).

“Ó glória de mandar! Ó vã cobiça”…

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