quarta-feira, 16 de março de 2011

… E TODOS, TODOS SE VÃO!

Ver partir jovens cuja formação tanto custou ao país é penoso para além de hipotecar o nosso futuro coletivo.

“Há algo de profundamente errado na maneira como hoje vivemos” assim afirma, nas primeiras palavras do seu livro “Um Tratado sobre os nossos actuais descontentamentos”, Tony Judt. Qualquer um de nós poderá fazer a mesma constatação seja pela via da racionalidade, seja pelo simples olhar deste mundo cruel.

Não sei é se haverá alguém ou algum modo capaz de mudar essa maneira de estarmos no mundo, mas tenho fé.

No que a nós portugueses respeita, uma situação me ocorre ao espírito no contexto desta ideia de que é preciso mudar. É que, segundo dados oficiais divulgados por toda a comunicação social nos dias recentes, as exportações portuguesas aumentaram um pouco mais de 19% em janeiro – e esse é um caminho, dos poucos, que nos podem salvar da bancarrota. Só que, pelas mesmas vias, tomamos conhecimento, também, de que quatro diplomados saem do país em cada dia que passa. O risco eminente é o de nos tornarmos um país de restos. E depois?

Sem emigração os números do desemprego seriam ainda mais dramáticos do que os que temos, mas, ver partir jovens cuja formação tanto custou ao país é penoso para além de hipotecar o nosso futuro coletivo. E o mesmo se poderá dizer relativamente a trabalhadores a quem não é já a falta de emprego que empurra para fora do país, mas o fato de, entre nós, atingido um certo nível de evolução numa carreira, já não haver mais espaço para evoluir por falta de dimensão da economia para “aguentar” o seu potencial e a sua vontade de crescer profissionalmente. Aqui é óbvia, também, a incapacidade do mercado laboral português para absorver os mais qualificados e ambiciosos – no que se expressa, também, um destino trágico para o país.

A “fuga de cérebros” é, de resto, um problema tão relevante nestes tempos de crise quanto o é o desemprego e, quer por um lado, quer pelo outro, o futuro aparece pintado de cores muito negras.

Há, de fato, algo de profundamente errado, sem sentido, neste estado de coisas quando a “exportação” dos melhores de todos se torna uma realidade prosaica. Precisamos muito, é certo, de exportar bens e serviços, mas não podemos dar-nos ao luxo de “exportar” crescentemente trabalhadores qualificados e de alto potencial.

Vivemos angustiados com o défice das contas públicas e a dívida externa. Sem minimizar a sua relevância e nefastas consequências, creio que se tem cometido o erro de olhar menos ou com menor acuidade para os problemas da economia. Não sei se algum dia pagaremos aos nossos credores, em democracia, aquilo que já lhes devemos e o muito mais que aí virá. Mas sei que se não produzirmos mais e melhor, num mundo globalizado, não deixaremos de nos tornar insignificantes como nação.

Urgem políticas económicas novas, ousadas, viradas para o mundo dos negócios, para as PME e todas as empresas exportadoras. Só assim combateremos o desemprego e afastaremos a sangria que é a “fuga de cérebros” do nosso país. Não é sustentável agir apenas na frente das finanças públicas e ignorar tudo o mais – e, aqui, acrescento aquele mínimo de proteção social sem o qual a vida se torna vegetativa, um arremedo de existência digna.

Vai valer a pena acompanhar o esforço do povo japonês na resposta que darão às gravíssimas calamidades que o têm quase destroçado. É que eles sabem – e nós também – que é possível sair dos desastres e voltar à vida, à dignidade, ao bem estar. Mas os sacrifícios, porventura angustiantes, são caminho, sem alternativa, para aí chegar.

A crise que hoje nos corrói é, sobretudo, política e só pela via política poderá ser ultrapassada. Mas não é com fantochadas como as que os políticos dos partidos nos têm brindado nos últimos dias que sobreviveremos.

É melhor olhar Portugal nos olhos e deixar de contemplar o próprio umbigo.

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