quarta-feira, 3 de novembro de 2010

CIDADÃOS, POLÍTICOS E CORRUPTOS

Vivemos dias patéticos e de desespero sem líderes à altura da crise atual e sem ideias diferentes e melhores para um outro futuro, porventura, apenas, com alguma astúcia para a mera sobrevivência.

A política que há-de vir - política como doutrina, como ideologia, como arte, como ciência e como técnica - concebida por verdadeiros estadistas, ou imposta por um qualquer FMI a Portugal, não poderá passar ao lado de algumas questões, inelutáveis e inadiáveis, do nosso tempo, e de lhes procurar dar solução porventura alterando, mesmo, radicalmente o padrão de vida dos portugueses e o modelo de Estado que foi sendo construído no último meio século. E terá de o fazer, decerto, contra o populismo em que se deixou encurralar a democracia e que a está a destruir.

As questões, de hoje e do futuro, que mais preocupam países como o nosso, são o envelhecimento da população, o modelo social construído em torno de direitos impraticáveis, o crescimento, impossível de sustentar, com despesas na área da saúde e a imigração. Não serão as únicas questões, é certo, mas todas as demais não contarão se estas não forem devidamente resolvidas. Na verdade, as maleitas, graves, do quotidiano, como a dívida pública e o défice orçamental, o desemprego, a agonia da economia e outras de idêntica penosidade, são marginais àqueles grandes temas e problemas e encontrarão solução, mais ou menos sofridamente, com qualquer governo e num prazo mais ou menos alargado segundo a sua competência técnica.
Os outros problemas é que não.

Não são questões técnicas, mas de civilização.

Não são problemas de politiquice caseira, mas de Estado.

Não envolvem, apenas, o voluntarismo de cada um, mas a confiança de todos num outro paradigma da vida e nos seus novos protagonistas.

Vivemos dias patéticos e de desespero sem líderes à altura da crise atual e sem ideias diferentes e melhores para um outro futuro, porventura, apenas, com alguma astúcia para a mera sobrevivência. E com tanta irresponsabilidade à solta, tanto populismo disfarçado de patriotismo e de defensor dos pretensos mais carenciados, tanta falta de uma visão estratégica para o futuro do país, a democracia, mais ou menos formal em que nos movemos, corre sérios riscos de um colapso fatal.

De resto, há muito já que apodrece.

E enquanto tudo isto acontece vão surgindo, como cogumelos, casos de exploração ilegítima e desenfreada dos dinheiros do Estado – que é, afinal, o nosso, de contribuintes e consumidores que, também neste caso, deixam quantidades assustadoras de dinheiro nos cofres do Estado (é a situação que se evidencia quando compramos combustíveis ou circulamos em auto-estradas, por exemplo).

Como é, pois, possível conter a revolta quando a cupidez de certos dirigentes políticos vem à luz do dia evidenciando como, sem escrúpulos, alguns enriquecem sem limites e sem regras enquanto o cidadão comum é asfixiado pelo Estado com impostos e cortes dolorosos nas suas condições materiais de vida?

Ao nosso lado encontramos, crescentemente, pessoas que se limitam a sobreviver – ou a adiar a vida. Deparamos, por outro lado, com manifestações de riqueza inexplicáveis, ou, apenas, compreensíveis à luz de vidas sufragadas pela exploração dos outros e pela corrupção financeira, criminalidade desconcertante em que é, sobretudo, o Estado quem é mais atacado.
O problema principal do Estado, hoje, será o da definição das suas funções futuras, e, logo, do orçamento a afectar às mesmas. Mas aqui eu não posso esquecer que se não fosse a Escola Pública eu, porventura, oriundo de humilíssima família, não saberia hoje ler nem escrever; se não fosse o Hospital Público já não estaria cá para escrever estas indigentes crónicas; sem a protecção do Estado social teria, porventura os dias de vida abreviados pelas carências de quem foi verdadeiramente pobre.

Querem, cegamente, acabar com o Estado social? De verdade?

Eu vou por outro lado. Proponho que se puna severamente – duramente – quem colhe do Estado aquilo a que não tem direito num país que se quer solidário, quem corrompe e quem se deixa corromper com dinheiros públicos, quem utiliza o poder que tem no altar do Estado para explorar os ignaros cidadãos e, também, para desse palanque arrebanhar influências, fazer lobbie ilegítimo, vender promessas e favores, tratar no Parlamento e na Administração Pública de negócios meramente pessoais, promiscuir-se entre o público e o privado conforme os seus interesses materiais mais vis.

Com o ar de ungidos pelos deuses que mostram nos momentos solenes, muitos dos que dizem servir o Estado não fazem mais do que roubar-nos.
A todos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Sr. Dr. Vilar:

Gostaria de saber sobre o acesso a informação jurídica "on line", pois existem pessoas que o fazem por preços simbólicos, mas tal é difícil de encontrar.
Muito Obrigado1