sexta-feira, 7 de março de 2014

UM ADEUS AO PPD



O clientelismo político vem corroendo o pouco que resta em Portugal da democracia política. A viragem neoliberal fez o resto. 

É bem verdade que as palavras, por mais eruditas que sejam, não mudam a realidade e estas que ora escrevo, desencantadas que são, não hão-de ter qualquer valia. Não tenho ilusões. Com elas, por elas, nelas, tento, porém, pensar e, sobretudo, tomar consciência do que por aí vai. Acolho-me, pois, no transe, ao que disse, em 10 de junho de 2012, no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, no discurso que adrede proferiu e nunca será de mais lembrar, o Prof. António Sampaio da Nóvoa, (…)”As palavras não mudam a realidade. Mas ajudam-nos a pensar, a conversar, a tomar consciência. E a consciência, essa sim, pode mudar a realidade”.

Poderá? (pergunto-me) E se não puder, qual será a alternativa? Haverá, mesmo, alternativa?

Escrevo sobre o partido político em que me filiei nos primórdios da liberdade conquistada em Abril de 74 na sequência, aliás, de, há já alguns anos, seguir o itinerário do Dr. Francisco Sá Carneiro. E cumpre-me assumir, tanto tempo passado já, que ser militante do PPD, depois PSD, depois PPD/PSD me fez tão bem que não lhe querer dizer mal e que me fez tão mal que não posso dizer bem dessa militância.

Como o mundo é feito de mudança, decerto que hoje não penso como então, nem esse partido, que ajudei a implantar por este país fora, é o de então. Mas por vezes a corda parte quando a violência da mudança toca nos escaninhos do ser…

O PPD/PSD está a dizer adeus – a excomungar! – aqueles que mais dedicados lhe foram, o que não é um fenómeno novo, antes vem já do tempo inicial de um cavaquismo utilitarista. E, nesse darwinismo social está a despedir-se de si próprio no que lhe foi essencial.

O PPD/PSD, nascido social democrata, foi, logo no berço, adorado (e tutelado) pelos caciques do regime deposto em 25 de Abril que nele procuraram abrigar o seu estar, os seus interesses, as suas pertenças materiais e imateriais. Juntaram-se-lhe, após a derrota, em novembro de 1975, das forças que tentaram levar Portugal até um regime ainda mais totalitário que o de Salazar, alguns jovens turcos, vindos de várias trincheiras da inconsciência revolucionária, sedentos de vingança e, mais do que tudo, de poder. Alcançaram-no, exercem-no (em múltiplos areópagos) e, hoje, traçam-nos o destino hoje. Estava já ao lume, então, um panelão onde se cozinhava uma indigesta sopa de pedra.

Vieram, de seguida, os fundos comunitários e, por via da inerente gula, acasalaram-se, então, os interesses deles todos, antigos e novos oportunistas.

A história possível – por isso ainda muito carente de verdade! – evidência já, porém, como se destrói um povo por meios pretensamente democráticos e, no que ora me ocupa, através do clientelismo político incontrolável a que o PPD/PSD vendeu a sua alma. Sendo uma tese não especificamente ligada ao PPD, mas generalizável, assumo que o clientelismo político vem corroendo o pouco que resta em Portugal da democracia política. É útil, porém, - e foi sobretudo muito benemérito – para aqueles que se alcandoraram, um dia, direta ou indiretamente, às cúpulas do poder e, daí, comandam influências fluídas, amorfas, subtis.

A viragem neoliberal fez o resto. Já não sendo o partido substancialmente democrático que foi, o PPD/PSD abraçou, mais recentemente, o neoliberalismo renegando as suas raízes sociais. Hoje é inegável que persegue a desestruturação do Estado Social que a social democracia europeia e os seus valores erigiram, ao longo de muitos anos, após a II Grande Guerra.

Tendo sido dirigente do PPD nos anos 1980 convivi, de perto, com muitas pessoas convictamente imbuídas do espírito inicial, social democrata, do partido. Acompanhei-as anos a fio e fui por elas acompanhado, por vezes, em múltiplas atividades cívicas e políticas. Algumas ainda as vou encontrando, como eu desencantadas com o rumo que aquela paixão de um dia tomou. Entre muitos honrados militantes, cumpre-me salientar, neste tempo de vésperas,  o Dr. António Capucho, durante muitos anos incansável e lúcido Secretário Geral do PPD. Na hora em que os novos senhores do poder, “cristãos novos” sem alma, sem memória, sem nada, o expulsaram do seu partido – do meu também! – não posso calar um grito de revolta contra uma tão mesquinha e estúpida decisão.

O Dr. António Capucho, de facto, não poderia continuar ao lado de certa canalha cavaquista – passista que por aí prolifera. Nem a ver diluir-se o seu partido no CDS/PP como inegavelmente está a acontecer e parece ser inelutável.

Obrigado pelo que vivemos solidariamente no PPD, caro Amigo. O mundo não acaba aqui.
Não há machado que corte a raiz do pensamento”.

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