segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

CELEBRANDO A VIDA POR OCASIÃO DA “MORTE” DE NELSON MANDELA

Quero acreditar que o poder do amor que Mandela cultivou e levou ao apageu poderá, um dia, revolucionar os princípios da política.


Este é um aceno de ternura por alguém que sacrificou a sua liberdade para ser possível a liberdade dos outros.

Já foram, decerto, gastas todas as palavras – das mais sinceras às mais hipócritas, e outras – para homenagear Nelson Mandela. Na sua maioria não foram para além de banais esforços de auto elogio de pequenos políticos que, no transe, encontraram na ocasião um palco para se empoleirarem nos galhos da comunicação social e assim se autopromoverem à custa de um Homem a cujos calcanhares nunca chegaram nem chegarão. Afinal estas alturas são sempre propícias a uma certa boémia que consola os mais pequeninos.

O que interessa neste momento é, porém, celebrar o percurso moral, espiritual, cultural, intelectual e político de alguém que deixou uma marca presente na História.

A vida de Nelson Mandela.

A Vida, afinal.

Recordo que, quando vi na televisão a sua libertação da prisão, senti o início de um certo reencantamento do mundo. E, também que o mundo ia muito para além da Europa, sempre eurocêntrica, mas, afinal, muito minoritária, porventura, já, então, moribunda, até. Li naquele rosto, nesse momento, um outro, novo humanismo, uma grande sabedoria, a expressão de um ser humano que, tendo encontrado na vida um motivo para a perder fez desse motivo o sentido da sua existência.

Nada nasce de nada e nada se poderá tornar em nada (Espinosa). Nelson Mandela pertence a uma comunidade eterna de que todos fazemos parte, mas voou muito alto, liberto, como muito poucos das ilusões do ego. Percebeu que não era o interesse partidário, nem a perseguição cega de interesses individualistas que salvariam o seu país – e o mundo. Defendeu, por isso, a lógica da fraternidade, da entreajuda, da partilha, do perdão, do prazer de dar mais do que de receber.

Eis o que me marca ou como seu legado.

Há, pois, que celebrar a vida de Nelson Mandela, e não a morte.

Habituados a chorar – às vezes com lágrimas de crocodilo – a morte dos nossos, porventura não será porventura fácil compreender a infinita alegria que brota, quiçá entre lágrimas, dos cânticos e danças dos africanos que o adoram. Nas sociedades ocidentais tememos a morte e aprisionamos os velhos nos armazes do esquecimento. Utilitaristas que somos, só a felicidade material conta hoje no nosso quotidiano. Morrer é a infelicidade, o mal, o fim do hedonismo terrestre. Os africanos, ao contrário, vêm vida na morte, cultivam a “morte da morte”, em cada morte.

Quero acreditar que o poder do amor que Mandela cultivou e levou ao apogeu poderá, um dia, revolucionar os princípios da política.

A sacralização do humano pelo amor como expressão de uma nova espiritualidade no século XXI, anunciada por Albert Camus, é uma gramática de leitura da vida de Nelson Mandela.

Herdeiros espirituais que, muitos, dele somos, cumpre-nos mudar o nosso olhar sobre o mundo e sobre os outros homens e, sobretudo, ganhar coragem para os transformar.


Celebremos, pois, a vida de Nelson Mandela.

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