quarta-feira, 14 de julho de 2010

É PRECISO SANEAR OS PARTIDOS POLÍTICOS


Os partidos já pouco mais representam do que meros ranchos folclóricos, ou
associações recreativas de comes e bebes.


Não há, certamente, um único país que consiga, por muito tempo, resistir a políticas trapalhonas, a jogatinas partidárias, ou à instabilidade permanente quanto a metas e objectivos que deveriam ser maioritariamente assumidos e democraticamente concretizados mas que, afinal, não resistem às tácticas evolutivas de uns quantos iluminados das nomenclaturas partidárias que continuam a saga de destruir a pátria. E se houver, será do Terceiro mundo.

O povo português, na sua grande, esmagadora, maioria, está, porém, desnorteado, lendo e ouvindo dos comentadores políticos e dos titulares dos poderes instalados – no governo ou nas oposições – tudo e o seu contrário, do pessimismo estúpido ao optimismo balofo, eivados, ambos, de incompetências que bradam aos céus.

Titulava, há dias (10.07.2010), um semanário de grande expansão a propósito da guerrilha partidária a propósito das SCUT e na senda desse diz-que-diz-que diz:
“Comissões de utentes já não sabem bem sobre o que protestar. Mas vão protestar.”

Se isto não revela uma sociedade estonteada, egoísta e sem destino – tal como soberanamente se apresentam os que estão na governação ou na oposição à mesma – então já chegamos à barbárie cívica e, doravante, vale tudo.

Para que servem, de facto, as eleições democráticas – cada vez mais um ritualismo sem qualquer sentido! – se, depois, a prática delas decorrente ostraciza vilmente as escolhas dos eleitores?
Para que vale a escolha de uns quantos deputados ou, melhor, de partidos – que os deputados não são, em geral, senão fogos fátuos instrumentalizados por subtis interesses partidários – se, afinal, ninguém respeita, nem honra, os seus compromissos, antes se enredam, uns nos outros, em negociatas várias para manterem, apenas, o domínio do Estado ou destruírem, então, as bases em que, quem governa, assenta o seu poder (a chamada política da terra queimada – quanto pior for o governo tanto melhor será para as oposições).

A democracia implica, decerto, negociação de objectivos políticos entre todos os que nela estão envolvidos, desde os partidos às associações de trabalhadores e de empregadores e movimentos cívicos vários. Mas, uma vez aprovadas as políticas a seguir, não há que tergiversar mais. É cumprir os compromissos, se necessário através da força do Estado democrático.

O governo dos sindicatos, dos funcionários públicos, dos professores, dos médicos e enfermeiros, ou dos motoristas, etc. que, de facto é quem vem determinando, a seu bel-prazer, o que é de lei ou não, tem de acabar. Ou acabará, então, o país como Estado soberano, regredindo até ao feudalismo medieval, corporativista.

Neste contexto dramático, onde poucos ainda preservam mínimos de dignidade cívica, ética e política, os partidos já pouco mais representam do que meros ranchos folclóricos, ou associações recreativas de comes e bebes, acéfalos, gastando, todavia, à tripa forra os dinheiros dos ignaros contribuintes.

Não poderemos, porém, aceitar passivamente os ventos que vão soprando no sentido de levar o eleitor a renunciar a ser pessoa, e que apontam para a renúncia à história como projecto humano, em favor do poder absoluto de deuses obscuros, ávidos de sacrifícios humanos.
Ora, como é por aí que os partidos políticos em geral avançam, só há uma solução democrática para quantos cidadãos sonham e lutam por um mundo novo, mais justo e solidário, transparente e incorrupto. Tal solução passa por os portugueses abandonarem os partidos, desfiliando-se deles.

Lamento profundamente que, a meu ver, outro caminho democrático inexista, sendo certo que a sociedade civil, de mil formas, pode perfeitamente fazer emergir a vontade popular (caso, por exemplo, dos orçamentos participativos já em voga e também com exemplos tímidos, embora, em Portugal).

É a hora de deixar os partidos políticos a falar sozinhos – se alguma vez ultimamente se dirigiram verdadeiramente à sociedade. É tempo de assumirmos a responsabilidade do que somos e vivê-la com valores. É, também, o momento de deixaremos de alimentar a opulência dos que capturaram o Estado e brincam à democracia à custa de todos nós.

Os partidos políticos que temos não têm mais futuro. Mas o futuro democrático não dispensará novas organizações partidárias. Ponto é levar a imaginação ao poder.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

É PRECISO PÔR O PODER FINANCEIRO NO SEU LUGAR


A responsabilidade matricial da presente situação está intimamente correlacionada com a violação grosseira, por parte de muitos agentes e instituições financeiras, de regras elementares da economia de mercado e das obrigações inerentes à democracia

Uma crise, por mais funda que seja – e a crise que assola sobretudo o mundo ocidental, originada, há cerca de dois anos, nos Estados Unidos tem sido um verdadeiro terramoto, quer no setor financeiro, quer na economia, no plano social e, ainda, quanto às finanças públicas – pode ser também uma oportunidade para encontrar soluções para um futuro melhor.

Ainda que timidamente, julgo, na verdade, que alguns sinais de mudança na economia já estão a acontecer, num sentido positivo, nomeadamente em Portugal.

Não é possível, porém, esquecer a responsabilidade e os responsáveis pela actual crise. E uma conclusão adianto, sem ter sobre ela quaisquer dúvidas: é imperioso subordinar o poder financeiro à Política.

É que a responsabilidade matricial da presente situação crítica está intimamente correlacionada com a violação grosseira, por parte de muitos agentes e instituições financeiras, de regras elementares da economia de mercado (também ele, porém, escassa e defeituosamente regulado) e das obrigações inerentes à democracia, nomeadamente a de transparência, sendo que a busca do lucro a qualquer preço foi, apenas, mais um ingrediente que se somou aos restantes factores que levaram à crise.

Ora, conhecido o diagnóstico, recolhidos os indícios, identificados os prevaricadores, seria de esperar que daí resultasse a sua condenação nos termos da lei e, também, com fins preventivos. Mas, aqui, a Europa claudicou, ao contrário dos EUA onde decorreram rápidos processos e convenientes decisões judiciais. Prevaleceu, na Europa, com efeito, uma generosidade provinciana amparada por um espírito neo-liberal ultramontano que é o que, hoje, caracteriza a U.E e a leva a proteger, além do aceitável, a desvairada finança privada.

Dois anos e meio depois do pânico que seguiu à queda do Lehman Brothers, tem cabimento perguntar-se o que mudou no sector financeiro. Pouco ou nada é a resposta. Os bancos terão reembolsado a ajuda dos Estados – concedida quase sem condições e à custa de todos nós – e encontram-se à rédea solta de novo. Os mercados continuam a especular sem rei nem lei aproveitando uma instabilidade que são os primeiros, de resto, a alimentar, porque quanto mais volatilidade mais dinheiro ganharão (cfr. Alternatives Economiques, nº 293 – Julho-Agosto 2010).

Impõe-se, por isso, fazer reformas profundas, ambiciosas e inovadoras no setor financeiro. Não bastarão, aqui, novas regras para colocar o poder financeiro ao serviço da economia, sendo necessário que os bancos, os seus acionistas e gerentes e, mesmo, os Estados (incluíndo a UE) mudem de comportamento. Três protagonistas estão, de facto, no centro do furacão: os bancos, de que deve limitar-se o tamanho e reconsiderar as fronteiras; os acionistas dos bancos únicos capazes de representar um contra-poder face à influência do mercado; e, por fim, os Estados, muitas vezes apresentados como reféns do poder financeiro, mas que são, afinal, quem tem os meios para voltar a colocar a finança ao serviço da economia.

Apesar da crise, os bancos expandem-se, porém, como se a crise não fosse com eles. Ao lado da banca comercial tradicional, que recolhe os depósitos e concede empréstimos, os bancos continuam a desenvolver o seu papel de intermediários nos mercados abarcando, também, a gestão de activos por conta dos seus clientes, vários serviços sofisticados para as grandes empresas (introdução na Bolsa, aumento de capital, empréstimos, operações de fusão e aquisição, etc). Para eles, se alguma coisa mudou, quase tudo, afinal, ficou na mesma.

Os bancos capturaram, também, os cidadãos – que amesquinham sempre que querem – e o seu patrocínio: eles são so donos das nossas casas, dos nossos carros, das empresas, de quase tudo o que temos.

É por tudo isso que a Política tem que reassumir o seu papel no sistema financeiro tanto quanto a sociedade civil e empresarial também não pode ficar de braços cruzados. São necessários, ao lado dos bancos privados, outros, públicos, cooperativos e mutualistas. E é preciso que os Estados intervenham na vida financeira através de esquemas rigorosos e transparentes de regulação e, ainda, através de todos os outros meios que possam colocar as finanças ao serviço da economia e dos cidadãos.