O clientelismo político vem corroendo o
pouco que resta em Portugal da democracia política. A viragem neoliberal fez o
resto.
É bem verdade
que as palavras, por mais eruditas que sejam, não mudam a realidade e estas que
ora escrevo, desencantadas que são, não hão-de ter qualquer valia. Não tenho
ilusões. Com elas, por elas, nelas, tento, porém, pensar e, sobretudo, tomar
consciência do que por aí vai. Acolho-me, pois, no transe, ao que disse, em 10
de junho de 2012, no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas,
no discurso que adrede proferiu e nunca será de mais lembrar, o Prof. António
Sampaio da Nóvoa, (…)”As palavras não
mudam a realidade. Mas ajudam-nos a pensar, a conversar, a tomar consciência. E
a consciência, essa sim, pode mudar a realidade”.
Poderá? (pergunto-me)
E se não puder, qual será a alternativa? Haverá, mesmo, alternativa?
Escrevo sobre o
partido político em que me filiei nos primórdios da liberdade conquistada em
Abril de 74 na sequência, aliás, de, há já alguns anos, seguir o itinerário do
Dr. Francisco Sá Carneiro. E cumpre-me assumir, tanto tempo passado já, que ser
militante do PPD, depois PSD, depois PPD/PSD me fez tão bem que não lhe querer
dizer mal e que me fez tão mal que não posso dizer bem dessa militância.
Como o mundo é
feito de mudança, decerto que hoje não penso como então, nem esse partido, que
ajudei a implantar por este país fora, é o de então. Mas por vezes a corda
parte quando a violência da mudança toca nos escaninhos do ser…
O PPD/PSD está a
dizer adeus – a excomungar! – aqueles que mais dedicados lhe foram, o que não é
um fenómeno novo, antes vem já do tempo inicial de um cavaquismo utilitarista.
E, nesse darwinismo social está a despedir-se de si próprio no que lhe foi
essencial.
O PPD/PSD,
nascido social democrata, foi, logo no berço, adorado (e tutelado) pelos
caciques do regime deposto em 25 de Abril que nele procuraram abrigar o seu
estar, os seus interesses, as suas pertenças materiais e imateriais. Juntaram-se-lhe,
após a derrota, em novembro de 1975, das forças que tentaram levar Portugal até
um regime ainda mais totalitário que o de Salazar, alguns jovens turcos, vindos
de várias trincheiras da inconsciência revolucionária, sedentos de vingança e,
mais do que tudo, de poder. Alcançaram-no, exercem-no (em múltiplos areópagos)
e, hoje, traçam-nos o destino hoje. Estava já ao lume, então, um panelão onde
se cozinhava uma indigesta sopa de pedra.
Vieram, de
seguida, os fundos comunitários e, por via da inerente gula, acasalaram-se,
então, os interesses deles todos, antigos e novos oportunistas.
A história
possível – por isso ainda muito carente de verdade! – evidência já, porém, como
se destrói um povo por meios pretensamente democráticos e, no que ora me ocupa,
através do clientelismo político incontrolável a que o PPD/PSD vendeu a sua
alma. Sendo uma tese não especificamente ligada ao PPD, mas generalizável,
assumo que o clientelismo político vem corroendo o pouco que resta em Portugal
da democracia política. É útil, porém, - e foi sobretudo muito benemérito –
para aqueles que se alcandoraram, um dia, direta ou indiretamente, às cúpulas
do poder e, daí, comandam influências fluídas, amorfas, subtis.
A viragem
neoliberal fez o resto. Já não sendo o partido substancialmente democrático que
foi, o PPD/PSD abraçou, mais recentemente, o neoliberalismo renegando as suas
raízes sociais. Hoje é inegável que persegue a desestruturação do Estado Social
que a social democracia europeia e os seus valores erigiram, ao longo de muitos
anos, após a II Grande Guerra.
Tendo sido
dirigente do PPD nos anos 1980 convivi, de perto, com muitas pessoas convictamente
imbuídas do espírito inicial, social democrata, do partido. Acompanhei-as anos
a fio e fui por elas acompanhado, por vezes, em múltiplas atividades cívicas e
políticas. Algumas ainda as vou encontrando, como eu desencantadas com o rumo
que aquela paixão de um dia tomou. Entre muitos honrados militantes, cumpre-me
salientar, neste tempo de vésperas, o
Dr. António Capucho, durante muitos anos incansável e lúcido Secretário Geral
do PPD. Na hora em que os novos senhores do poder, “cristãos novos” sem alma,
sem memória, sem nada, o expulsaram do seu partido – do meu também! – não posso
calar um grito de revolta contra uma tão mesquinha e estúpida decisão.
O Dr. António
Capucho, de facto, não poderia continuar ao lado de certa canalha cavaquista –
passista que por aí prolifera. Nem a ver diluir-se o seu partido no CDS/PP como
inegavelmente está a acontecer e parece ser inelutável.
Obrigado pelo
que vivemos solidariamente no PPD, caro Amigo. O mundo não acaba aqui.
“Não há machado que corte a raiz do
pensamento”.
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