É tempo de repensar o humano no homem – o
humano e não o homem, a humanidade do homem para além, ou fora, da sua
existência circunstancial.
Presos à roda da
vida, não passaremos de meros alcatruzes a tirar a água do fundo do poço e a
tentar levá-la aos nossos ilusórios moinhos. Em vão procuramos fingir o
contrário, mas é mesmo assim!
Passaram-se semanas
desde a última vez que vim a esta coluna, que generosamente me é
disponibilizada semanalmente, para deixar umas pegadas no tempo que passa e
sobre algumas “coisas” que passam por ele e com ele. No entretanto, o Sr.
Eusébio da Silva Ferreira cansou-se de nós e deixamos de o ver. E isso tocou-me
fundo. Falaram muitos, então, em levá-lo ao Panteão Nacional – era quem mais e
mais o “recordava”, aliás, nesses dias de eclipse, de tal forma que chegou a
assustar-me a hipótese de uma mortandade de algumas ilustríssimas personagens
que passavam (passeavam) eufóricos, incessantemente, nas televisões da desgraça
mercantilista (a morte é um grande negócio!) ao lado do Sr. Eusébio.
Homenageando-se a si próprias, claro, a pretexto de o lembrarem …
Creio bem –
voltando ao essencial – que o Panteão Nacional perderá o seu simbolismo se tal
não acontecer. Porque, afinal, aquele grande jogador, moçambicano de nascimento
e português por via de um tempo colonial e, creio bem, que, depois, por opção
pessoal, é um símbolo de um Portugal que não acabou, mas, antes dorme, apenas,
num leito de sofrimento transitório. Um Portugal maior, decerto, que aqueles que
ora o habitam.
Assomou-me à
memória, no transe, Agostinho da Silva e a sua fé numa missão especial de
Portugal no mundo: a de construir um quarto império cultural (já oiço vozes a
chamar: loucura!, mas deixem-me ir até ao fim). Recordo, em particular, uma
frase “A Europa esgotou-se no poder e
temos, agora, de partir para outra fórmula, que é cada homem ser aquilo que é”
(in Agostinho da Silva, Dispersos, p.
128).
Ao recordar os
feitos gloriosos desse grande jogador universal, não consigo calar um grito de
revolta pela humilhação por que passam, neste início de milénio, os
portugueses, quer no contexto nacional quer (sobretudo) no concerto das nações.
Tolhidos pelo medo, temos permitido que nos suguem a vida e nos tentem
arrancar, até, as nossas próprias raízes. E aí, sim, não haverá mais
alternativas, pois estas exigem, como condição essencial, a liberdade.
É tempo de repensar
o humano no homem – o humano e não o homem, a humanidade do homem para além, ou
fora, da sua existência circunstancial (Emmanuel Levinas).
Urge dar um rumo
a Portugal e um futuro aos portugueses.
O Panteão
Nacional, além de depósito de grandes memórias poderá, também, ser um tabelião
de ambições, juntando o Passado ao Futuro. O tempo colonial – a História há-de,
um dia, valorizar Portugal por esse tempo! – e a Diáspora que hoje se expande –
e onde estão, porventura, as sementes de um outro amanhã.
Ser português
vale a pena. Os portugueses foram e são um povo extraordinário na longa
História da humanidade. Deveríamos sentir, mais ainda nestes momentos, o dever
de voltar aos textos do Pe. António Vieira, aos poemas de Fernando Pessoa, à
escrita de Agostinho da Silva, a Natália Correia...
Quando o mundo
está na mão de oportunistas, um aceno mais de simpatia por Eusébio nunca será
excessivo. Sobretudo quando se olha esse Homem no seu tempo, em toda a
dignidade dessa palavra e em toda a dimensão do seu tempo.
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