Mesmo sem o sentirmos, as
problemáticas e, sobretudo, as formas de governação estão sibilinamente a
mudar.
Vamos
sabendo o que se passa no mundo por uma comunicação social que não se ocupa
senão do que é a espuma dos dias, a superfície das dinâmicas sociais, a torpeza
da política caseira. Creio, também, que a generalidade dos portugueses,
massacrados pela austeridade irracional – há austeridade boa e necessária! – e
dominados subtilmente pelo medo que se instalou na sociedade em decomposição
que é a nossa, também não quererá saber de mais nada, ou não poderá, mesmo que
o quisesse.
A
Crimeia, anexada por Putin, dono da nova Rússia colonial, é coisa longínqua e
nada temos a ver com a geopolítica inerente a esse crime. O Afeganistão é ainda
mais longe. Certo que a Síria já é mais perto, mas, isso tem a ver com o
“Estado Islâmico” (E.I.), talvez a
Al-Qaeda, e diz respeito, pois, aos americanos, tal como o que se passa no
Iraque. As células terroristas do E.I. que se vem instalando na Europa, nada
querem connosco e não é por um punhado de jovens portugueses terem a elas
aderido que não vamos dormir. De igual modo, o referendo na Escócia e o,
eventual, na Catalunha não tem relevância neste hipócrito optimismo panglóssico
em que vivemos anestesiados.
Vem
aí dinheiro fresco da Europa comunitária, não vem? É deixar andar…
Neste
engano de alma é, pois, minimizado o real “choque de civilizações” que alastra
mundo fora, bem como o abismo à borda do qual a Europa (UE) se encontra,
hesitante entre nacionalismos (cada vez mais poderosos) e europeísmo (cada vez
menos relevante). Acresce que os Estados-nação, realidade internacional que nos
habituamos a ver como estruturantes do tempo e do espaço, estão em causa
cedendo perante fenómenos globais, novos. Assim, é já evidente e notório o
enfraquecimento ou a relativização dos poderes estaduais e o crescente
alargamento de um outro espaço vazio de normas, sem ética política e que
vilipendia a dignidade humana. É a crise do Estado soberano que se anuncia e concretiza
mesmo, aqui e ali.
Nada
disto nos é estranho e, pelo contrário, há-de influir profundamente no nosso
destino. Por isso se justificaria equacionar estas questões, colocar hipóteses
de solução para o dia D. e traçar uma estratégia de defesa nacional
conveniente.
Num
livro recente – The Fourth Revolution, The Global Race to Reinvent the State,
The Penguin Press, New York, 2014, John
Micklethwait, Adrian Wooldridge mostram como mesmo sem o sentirmos, as
problemáticas e, sobretudo, as formas de governação estão sibilinamente a
mudar, correndo o Ocidente o risco sério de passar ao lado dessa revolução e de
ficar para trás.
Que o Estado social já, em muitos casos, se tornou uma
memória, ninguém o ignorará. Mas é agora, também o Estado-nação, entidade política,
que está em crise acentuada.
O que o futuro nos reserva depende de tantos factores que não
se poderá adivinhar. Mas poderá prospectivar-se. Talvez, nesse itinerário, o
país que somos venha a ocupar, na cena internacional, um outro, decisivo papel.
Valerá a pena pensar nestas coisas.