quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

UE: ENTRE A REFUNDAÇÃO E O PRINCÍPIO DO FIM


A Europa está a ser germanizada. O prémio Nobel da Paz não poderia, jamais,gratificar esse trágico itinerário.

Entre inúmeras críticas, algumas delas profundamente depreciativas, a União Europeia recebeu o prémio Nobel da Paz 2012, alegadamente pela sua contribuição para a paz, a democracia e os direitos humanos durante mais de seis décadas.
E justamente.

Temos de recordar que a Europa, em tempos anteriores – longos tempos! – foi um quase permanente campo de batalha e muito para além das, mais próximas, duas Grandes Guerras mundiais. Sem ir muito longe na história, convém lembrar sucessivas tentativas imperialistas de alguns povos europeus no sentido de dominarem todo o Continente. Desde logo a Guerra dos Trinta Anos entre 1618 e 1648 – um conflito dramático entre os Habsburgos, senhores da Espanha e do Sacro Império Romano-Germânico, da Áustria, Hungria, Boémia, Holanda, Baviera, Flandres, norte de Itália e Bélgica, e os Bourbon de França. Desta guerra saiu o conhecido Tratado de Vestefália e, com ele, o fim da existência de dois poderes na Europa: o temporal e o espiritual em que se vivia então. Trouxe, este tratado, o início da independência dos Estados sobre a situação que era conhecida como Republica Christiana. Não trouxe, porém, a paz. Nos séculos seguintes continuaram a surgir guerras sangrentas na Europa: recordem-se as guerras de 1701-1713, 1756-1763, 1792-1815 (cfr. Paul Viotti, International Relations and World Politics, New Jersey: Prentice Hall, 1947). Depois, as duas referidas Grandes Guerras, o Holocausto, a ocupação soviética da Europa de Leste, a guerra civil na Irlanda e outros conflitos localizados dentro dos Estados europeus, enraizados em nacionalismos abafados e longe de estarem resolvidos. A Catalunha expressa-o hoje com clareza, mas há várias outras situações latentes.

Sem a construção europeia é de admitir que o terror da guerra não tivesse sido esconjurado durante estas últimas décadas da Europa.

O Nobel da Paz tem, pois, sentido em 2012, mas virado ou olhando o passado… É que, no presente, não se enraízam quaisquer esperanças de novas primaveras na União Europeia! A contrário, são inúmeros os fantasmas que voltejam sobre o presente ameaçando o futuro. A incompetência dos líderes europeus dói, tanto quanto a sua “liquidez” política e doutrinária. O populismo avança subtilmente entre a pobreza e os excluídos da sociedade. Os nacionalismos, que nunca morreram, estão a equipar-se, enquanto a democracia sofre dores porventura terminais às mãos da Sr.ª Merkel. Quem se der ao esforço de estudar o contexto sócio-político e financeiro da grande depressão de 1929 vai aí encontrar a sopa de pedra que os europeus tiveram de comer a seguir. Está lá tudo!

Não há qualquer tipo de solidariedade europeia nos tempos que correm e talvez nunca tenha havido qualquer sincera solidariedade fora dos interesses de certos Estados. Lembro, apenas, de passagem, que seria conveniente, um dia, fazer a comparação do que recolhemos dos fundos europeus, relativamente ao que pagamos à Europa e, sobretudo, do que empresas, protegidas de muitos Estados (a França, a Alemanha…) levaram para sua casa dos fundos formalmente atribuídos a Portugal (transferência de tecnologia, realização de grandes obras públicas, empréstimos deles e reembolsos nossos, etc.).

A Europa está a ser germanizada. Ora, o prémio Nobel da Paz não poderia, jamais, gratificar esse trágico itinerário. O medo, a insegurança, a angústia dos europeus que estão a sofrer uma austeridade imoral não poderia aceitar tal gratificação. Seria um sinal para avançar no sentido de um super-Estado, na base de (pretenso) super povo, uma raça alegadamente superior contra todos os outros cidadãos da Europa.

Uma estratégia repetida, nestas colunas, à exaustão tem a ver com a ideia de Portugal como país euro-atlântico. Só nesse âmbito poderemos ser um povo que conte no contexto de um futuro incerto. Há que reler e pensar os escritos do Pe. António Vieira, de Fernando Pessoa e de Agostinho da Silva. Talvez valesse mais a pena do que andarmos de mão estendida às ordens da “Troika”.

E, para terminar: há por aí alguém disponível para levantar um programa tipo ERASMUS no âmbito dos países de língua portuguesa? Aceito ideias e agradeço-as antecipadamente.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

DAR SENTIDO AOS SACRIFICIOS


Não estamos condenados à pobreza, ao sofrimento e à ignorância!

As nossas vidas perderam muito do seu significado e sentido nos últimos tempos e não foi só por questões económicas conexas com a austeridade que os poderes nos vão impondo e a que alguns espantosamente se subjugam silenciosamente, quando a não defendem. Vivemos, sobretudo, uma época de crenças moles e raras convicções. Um tempo de lassidão e laxismo. Como disse Martin Luther king “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons”.

O 10 de junho, dia de Portugal, de Camões e das Comunidades é passado geralmente na praia. O 5 de outubro (que deixou de ser dia feriado) reúne uns pequenos grupos de republicanos desnorteados nalgumas cerimónias incaracterísticas  e a que o povo é absolutamente alheio. O 1º de dezembro é para as compras e não chega. E o Natal que aí vem, felizmente menos mercantilizado, já nada diz a muitos de nós afastados do consumismo que o vinha caracterizando.

Um silêncio ensurdecedor instalou-se no nosso quotidiano comum e aprisiona, mesmo, a consciência de muitos. Reina sobre as grandes questões da sociedade, e até já muitas elites intelectuais embarcaram na desistência de pensar a vida.

O pragmatismo que se impõe nas contas públicas e nos orçamentos privados não é inconciliável, porém, com um plano de batalha transformador da sociedade a médio e longo prazo.

O maior fator do desespero dos cidadãos é a vacuidade do discurso dos poderes públicos quando se fala do futuro.

Não estamos condenados à pobreza, ao sofrimento e à ignorância!

Uma outra sociedade é possível!

A pobreza em que mergulhamos não tem a ver, apenas, com a carência dos bens materiais, a falta de alojamento condigno, a deficiente alimentação e males semelhantes. A grande interrogação e a maior angústia, hoje, tem a ver com o facto de que ninguém sabe o que será o amanhã.

O medo mata. Vidas, sonhos e um futuro decente. Está instalado na nossa sociedade. O Ocidente está nas mãos de gente sem memória. A UE, sem norte, ergue-se como o templo dos egoísmos indiferente às crescentes desigualdades sociais. Ora, as sociedades em crise são o terreno propício para crescer o medo e toda a espécie de radicalizações. Em Portugal, um país de joelhos, cada dia que passa somos menos pessoas. Os governantes, que parecem só saber a tabuada do défice e da dívida, ignoram o desemprego, desvalorizam a redução brutal dos rendimentos das famílias e cortam os apoios sociais. A subida draconiana dos impostos vai de par com a agonia inexorável do funcionamento dos serviços públicos. Culpabiliza-se os cidadãos pelo consumismo, pelo desequilíbrio externo, pelo desemprego, por estarem reformados, por não emigrarem.  A mentira é anestesiante e desmotivadora, mas não deixa de ser mentira ainda que gritada todos os dias aos ouvidos de encautos cidadãos.

A regra de ouro de qualquer contrato social é a defesa dos mais desprotegidos. Ora, é precisamente o contrato social que existia entre o Estado e os cidadãos que tem sido meticulosamente rasgado, escamoteado no acordo com a “Troika” que bebe das mesmas ideias e opções de Thatcher.

Está em marcha a desconstrução do Estado social e que ninguém se iluda pois com ela vai o fim da democracia.

É preciso reapreciar o Estado-providência? É, seguramente. Mas este é uma patologia do Estado Social que, esse, é, um dos pilares da democracia. Cuidado porque, por este andar, vai o bebé com a água do banho…