A Europa está a ser
germanizada. O prémio Nobel da Paz não poderia, jamais,gratificar esse trágico
itinerário.
Entre inúmeras
críticas, algumas delas profundamente depreciativas, a União Europeia recebeu o
prémio Nobel da Paz 2012, alegadamente pela sua contribuição para a paz, a
democracia e os direitos humanos durante mais de seis décadas.
E justamente.
Temos de
recordar que a Europa, em tempos anteriores – longos tempos! – foi um quase
permanente campo de batalha e muito para além das, mais próximas, duas Grandes
Guerras mundiais. Sem ir muito longe na história, convém lembrar sucessivas
tentativas imperialistas de alguns povos europeus no sentido de dominarem todo
o Continente. Desde logo a Guerra dos Trinta Anos entre 1618 e 1648 – um
conflito dramático entre os Habsburgos, senhores da Espanha e do Sacro Império
Romano-Germânico, da Áustria, Hungria, Boémia, Holanda, Baviera, Flandres,
norte de Itália e Bélgica, e os Bourbon de França. Desta guerra saiu o conhecido
Tratado de Vestefália e, com ele, o fim da existência de dois poderes na
Europa: o temporal e o espiritual em que se vivia então. Trouxe, este tratado, o
início da independência dos Estados sobre a situação que era conhecida como Republica Christiana. Não trouxe, porém,
a paz. Nos séculos seguintes continuaram a surgir guerras sangrentas na Europa:
recordem-se as guerras de 1701-1713, 1756-1763, 1792-1815 (cfr. Paul Viotti,
International Relations and World Politics, New Jersey: Prentice Hall, 1947).
Depois, as duas referidas Grandes Guerras, o Holocausto, a ocupação soviética
da Europa de Leste, a guerra civil na Irlanda e outros conflitos localizados
dentro dos Estados europeus, enraizados em nacionalismos abafados e longe de
estarem resolvidos. A Catalunha expressa-o hoje com clareza, mas há várias
outras situações latentes.
Sem a construção
europeia é de admitir que o terror da guerra não tivesse sido esconjurado
durante estas últimas décadas da Europa.
O Nobel da Paz
tem, pois, sentido em 2012, mas virado ou olhando o passado… É que, no presente,
não se enraízam quaisquer esperanças de novas primaveras na União Europeia! A
contrário, são inúmeros os fantasmas que voltejam sobre o presente ameaçando o
futuro. A incompetência dos líderes europeus dói, tanto quanto a sua “liquidez”
política e doutrinária. O populismo avança subtilmente entre a pobreza e os
excluídos da sociedade. Os nacionalismos, que nunca morreram, estão a
equipar-se, enquanto a democracia sofre dores porventura terminais às mãos da Sr.ª
Merkel. Quem se der ao esforço de estudar o contexto sócio-político e
financeiro da grande depressão de 1929 vai aí encontrar a sopa de pedra que os
europeus tiveram de comer a seguir. Está lá tudo!
Não há qualquer
tipo de solidariedade europeia nos tempos que correm e talvez nunca tenha
havido qualquer sincera solidariedade fora dos interesses de certos Estados.
Lembro, apenas, de passagem, que seria conveniente, um dia, fazer a comparação
do que recolhemos dos fundos europeus, relativamente ao que pagamos à Europa e,
sobretudo, do que empresas, protegidas de muitos Estados (a França, a
Alemanha…) levaram para sua casa dos fundos formalmente atribuídos a Portugal
(transferência de tecnologia, realização de grandes obras públicas, empréstimos
deles e reembolsos nossos, etc.).
A Europa está a
ser germanizada. Ora, o prémio Nobel da Paz não poderia, jamais, gratificar
esse trágico itinerário. O medo, a insegurança, a angústia dos europeus que
estão a sofrer uma austeridade imoral não poderia aceitar tal gratificação. Seria
um sinal para avançar no sentido de um super-Estado, na base de (pretenso)
super povo, uma raça alegadamente superior contra todos os outros cidadãos da
Europa.
Uma estratégia
repetida, nestas colunas, à exaustão tem a ver com a ideia de Portugal como
país euro-atlântico. Só nesse âmbito poderemos ser um povo que conte no
contexto de um futuro incerto. Há que reler e pensar os escritos do Pe. António
Vieira, de Fernando Pessoa e de Agostinho da Silva. Talvez valesse mais a pena
do que andarmos de mão estendida às ordens da “Troika”.
E, para
terminar: há por aí alguém disponível para levantar um programa tipo ERASMUS no
âmbito dos países de língua portuguesa? Aceito ideias e agradeço-as
antecipadamente.