sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O FUTURO COMEÇA HOJE

A crise que o mundo é uma crise da humanidade que não consegue humanizar-se.


Pouco sabemos, na verdade e com inteira verdade, sobre o que se passa neste mundo líquido em que se traduz o nosso tempo. A distância entre a consciencialização do sentido e significado dos sucessivos eventos e estes existe com crescente e dramática dimensão.


Só percebemos, geralmente, o que vai na espuma dos dias e, daí, a dificuldade em pensar para além do presente. Mas tal nunca foi, talvez, tão necessário como hoje.


Na verdade, interrogamo-nos sobre problemas ligados à saúde (taxas moderadoras, ou outros) e dos políticos e governantes vem uma resposta assente apenas na tabuada; queremos saber do abono de família ou da pensão social e lá vem outra vez a tabuada; os desempregados procuram trabalho e, de novo, a resposta vem da tabuada. E este rosário continuaria sem fim neste país exangue com um Estado a caminhar, a passos largos, para se tornar um Estado falhado e, muitos de nós, meros servos da finança e dos mercados financeiros.


Ninguém, na classe dirigente, política ou não, está a pensar e a decidir o que Portugal será daqui a 10, 20 ou 50 anos. Mas isso é absolutamente necessário se não aceitarmos que as forças do mercado assumam, no seu interesse, a soberania escassa que ainda temos. Se nada for idealizado, planeado, plantado, então é certo que o descalabro continuará até às cinzas e só restará, de um lado, a fortuna extrema de poucos e, do outro, a miséria total de quase todos.


É preciso começar a escrever a história do futuro.


Estamos a virar uma página da história e, porventura, sem disso termos consciência, a ser agentes de transformações socretais de onde há-de surgir uma nova sociedade. Mas o que vai mudando, por vezes sem o contextualizarmos, exprime-se e é marcado por sacrifícios, sofrimento e lágrimas morais e materiais. O tempo do fácil conforto, do consumo ilimitado, das ideias feitas, dos dogmas eternos, da certeza e segurança, de negócios fáceis, de trabalho garantido, de ociosidade paga já acabou e, provavelmente, não mais voltará. Não terá sentido, pois, mesmo neste contexto, que as nossas esperanças, dilaceradas pela dúvida, pelo individualismo e pelo negativismo, não busquem o conforto das grandes certezas.


A crise que o mundo – e não só o nosso país atravessa – é uma crise da humanidade que não consegue humanizar-se.


Apesar de tudo, actualmente, se resumir à tabuada – das imposições da “Troika” à insensibilidade humanista do governo – nós pudemos acender uma luz ao fundo de um túnel diferente, porém, daquele, vertical, para que certos políticos apontam e nos querem levar.


Já não basta, porém, denunciar. Agora é urgente enunciar e abrir outros caminhos, avançar por outros sítios.


Não vale a pena continuar a martelar-se que tudo é urgente. É preciso saber, já, começar e dar os primeiros passos no sentido de mudar de vida e criar um mundo diferente.


As possibilidades não se encontrarão quando todo o Estado estiver desmantelado, nas mãos dos privados, nacionais ou estrangeiros. Temos de encontrar políticos, governantes ou não, que saibam esclarecidamente que não há reformas políticas sem, antes, haver reforma do pensamento político. A tecnocracia é um conjunto de ferramentas que não vale nada, nem serve para nada se não for guiada pela ideologia, pelo pensamento político oportuno e sagaz.


A maior crise deste tempo é uma crise de pensamento e de valores com sentido para além da conjuntura actual.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

DESCULPEM

As crises deste tempo, nas suas múltiplas manifestações, pretendem, afinal proceder infamemente e sobretudo a uma outra distribuição de riqueza.

Não ignoro que já foi dito e redito que se propaga na Europa – e, em geral, no mundo, ainda que subrepticiamente – uma luta de criptopoderes, não eleitos, contra o ideal democrático e para benefício exclusivo de interesses financeiros e da nomenclatura que os sustenta e, por eles, é sustentada. Desculpem que insista no tema, pois.


A barbárie está às portas, porventura já instalada mesmo, na, dita, civilização ocidental e nem precisa de um qualquer “Cavalo de Tróia”. É olhar a História com olhos de ver e não focalizar a reflexão, apenas, no hiato dos últimos 50 anos… A União Europeia é já pasto de chamas e o fogo promete crescer.

Não é o momento, este, porém, de problematizar a natureza humana, ou seja, se a sociabilidade do Homem é uma tendência natural e originária ou decorrente da sua evolução. As respostas seriam várias mas, entre muitas, talvez mereça particular atenção, nestes tempos de crise, o pensamento de Hobbes: em estado de natureza o Homem é mau (homo himini lupus) e só a vida em sociedade pode remediar tal maldade natural. E, acrescento por minha conta e risco, a sociedade que destrói a família, que derruba as protecções de quem trabalha, que ignora a solidariedade, que idolatra o egoísmo e o individualismo, o consumismo e se mercantiliza até à exaustão e tudo submete ao livre jogo dos mercados, nunca poderá trazer ao Homem (e ele também a construiu) os instrumentos para remediar essa maldade.


É muito difícil ser um homem bom numa sociedade que é má.

As crises deste tempo, nas suas múltiplas manifestações, pretendem, afinal – porque provocadas pelos homens – proceder infamemente e sobretudo a uma outra distribuição de riqueza. Prova-o o facto, já incontornável, de, em países como Portugal, ser crescente a desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres. E o mesmo se verifica por todo o mundo onde os Estados perdem a soberania e os cidadãos a dignidade.


Não sei onde vai parar esta sociedade de risco e que caminhos novos são possíveis através de uma mudança do actual paradigma. Já estou convencido, porém, que nada será amanhã como é hoje e que só os homens livres – da fome, da angústia, da doença, da ignorância e de tudo o mais que apouca a humanidade - poderão contribuir para que algo mude, sem que tudo fique na mesma.


Dito isto, pego no recente ataque de hackers, ou piratas informáticos, a computadores do Ministério da Administração Interna de que veio a resultar a divulgação no espaço público de dados pessoais de mais de uma centena de agentes de autoridade. É obvio que repudio tal acção contra o Estado e as causas mesquinhas que tal determinaram. Mas não quero ficar no espaço de conforto que habitualmente caracteriza os cobardes e, por isso, retiro aqui o que de bom pode ter uma má acção.


E se esses “técnicos” – porventura a sociedade civil em geral – se tivessem empenhado em interceptar os computadores dos Duartes Lima, Dias Loureiro, Oliveiras e Costa e tantos outros! quando eles, à custa de todos nós (então, hoje e no futuro), fizeram fortunas incompreensíveis, será que as coisas teriam chegado onde chegaram?


Não se trata de um convite a práticas ilegais, mesmo que seja para combater outras, ainda mais ilegais. Mas acredito que a nossa sociedade seria mais justa e solidária e a lei mais eficaz se fossem arrombadas as fronteiras de tantos segredos impostos por lei (sigilo bancário, fiscal, de justiça…) e todos pudéssemos saber como nascem e medram certas fortunas: de políticos, de empresários, de profissionais liberais, sei lá que mais.


A sociedade civil tem, neste âmbito, uma força de que não tem ainda consciência. E estou certo de que se não agir, não será pelos meios processuais comuns (civis ou criminais) que a corrupção acabará e a Justiça triunfará.


Infelizmente.