quinta-feira, 12 de março de 2009

O HOMEM E O TRABALHO, HOJE.

O trabalho ocupa uma posição central dentro das grandes questões
que se colocam à nossa sociedade.

É geralmente reconhecido que, no meio da crise global que a todos nos afecta, a crise especificamente portuguesa – que não é de somenos importância e, até, talvez, de mais difícil ultrapassagem – tem tudo a ver com a falta de competitivdade do nosso país no concerto das economias. Andamos, há muito, vestidos à rico quando mal temos meios para viver, sequer, como remediados e, por isso, será, mais cedo ou mais tarde, inevitável adaptar o nosso nível de vida à nossa capacidade de produção. Algures se fala já, de resto, no, para muitos, “sacrilégio ideológico” de uma redução da retribuição do factor trabalho à míngua de alternativas em outros horizontes.

É inegável o dramatismo que decorrerá de uma eventual concretização da redução do nível de vida que conhecemos. Mas não é menos dramático o panorama que se nos apresenta quotidianamente, relativo ao crescimento acelerado do desemprego e à falta de novos empregos. Não fossem os vários esquemas públicos e privados de protecção e de solidariedade social que ainda resistem e outros que vão surgindo para as mais graves situações de carência social, e, decerto a paz social já estaria gravemente afectada no país.
No centro de todas as crises e no âmago da sua ressonância em cada um de nós, está o trabalho e a falta dele. O problema nem é novo, mas apresenta novos riscos e maior profundidade neste momento.

Já na encíclica “Laborem Exercens”, João Paulo II afirmava que o trabalho constitui uma dimensão fundamental da existência do homem, desde logo porque, além do mais, é um meio de realização da pessoa humana. Num certo sentido, diria, pois, que para se ser Homem há que trabalhar, sendo o desemprego um catástrofe também humana.
Hoje, porém, a relação das pessoas com o trabalho é um dos maiores problemas que afectam a convivialidade social, sobretudo na medida em que se perde, crescentemente, a consciência de que o trabalho não é, apenas, o antónimo de desemprego, mas, muito mais do que isso, um factor essencial de integração e de coesão social (Casimiro Ferreira).
Se é certo que o trabalho ocupa uma posição central dentro das grandes questões que se colocam à nossa sociedade – problemas humanos, sociais, económicos e políticos – é imperioso olha-lo de outros sítios, por vezes até improváveis, com cada vez maior cuidado. Creio que, de facto, é preciso olhar cada vez mais o Direito do trabalho nomeadamente do ponto de vista do empregador, dos desempregados, dos jovens à procura do primeiro emprego, das mulheres trabalhadoras, dos trabalhadores migrantes, dos trabalhadores autónomes economicamente dependentes.
O Código do Trabalho, na versão de 2009 vinda de entrar em vigor, tendo partido da ideia da flexigurança encalhou na gravidade da crise que, entretanto, se instalou por todo o lado e ficou no meio da ponte. E morrerá na praia, mais dia menos dia. O seu grande defeito será, porventura, o de se ter organizado para solucionar, numa certa perspectiva, algumas questões que, entretanto, deixaram de o ser, ou de estar na ordem do dia, enquanto outras, inimaginadas, vieram a ocupar o terreno da crise. Ademais há que reconhecer que o Direito do Trabalho é o direito dos que têm um emprego e a “questão social” do nosso quotidiano releva, sobretudo, para os que o não têm, ou o vão perder, se não perderam já. E, por outro lado, é já patente que o regime garantístico desse ramo do direito cede, como manteiga ao calor, perante a crise das finanças e da economia.
O pior cego é o que não quer ver. E o excessivo garantismo laboral, em cada dia que passa, vem-se mostrando uma utopia na crise. É por isso que insisto que é preciso, com lucidez e coragem, ver o nosso sistema laboral de outros sítios e deixar cair certos fantasmas postos de guarda a nada.
E-mail: antoniovilar@antoniovilar.pt

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